Segundo Dalai-Lama, “espiritualidade é aquilo que provoca no ser humano uma mudança interior”. O ser humano é um ser de mudança, pois nunca está pronto, está sempre se fazendo, física, psíquica, social, cultural e espiritualmente. As mudanças interiores são verdadeiras transformações capazes de dar um novo sentido e impulso à vida ou de abrir novas possibilidades de experiência e de profundidade rumo ao próprio coração e ao mistério de todas as coisas.
Isso porque não temos dentro de nós um núcleo duro e inflexível, nem uma estátua completamente esculpida, permanente e fixa; ser pessoa significa ser afetado por um processo dinâmico de mudança permanente. A partir do interior, a mudança desencadeia uma rede de transformações na comunidade, nas relações com a natureza e com o universo inteiro.
Nosso universo interior está em constante movimento
Mas viver em estado de mudança não significa viver um processo tranquilo; há uma constante tensão entre ordem e desordem, comunhão e solidão, evolução e revolução, segurança e insegurança, estabilidade e mobilidade.
Mudanças são a essência da vida, por isso sempre haverá o conflito, a insegurança e o medo que surgem com a mudança. Quando recusamos a aceitar que o medo, a insegurança e o conflito fazem parte da vida, fechamos a porta e perdemos a chance de muitas possibilidades novas e inimagináveis para nós mesmos; nossa vida torna-se estreita, encolhida, deixamos de ser plenamente humanos.
Viver em plenitude é captar, na ordem aparente das situações, as sementes de mudança e preparar o terreno do coração para que estas sementes germinem e frutifiquem. Isso significa viver em um estado de permanente movimento que pode nos impelir para o novo e surpreendente. Acomodar-se, recusar evoluir, não abraçar a mudança, é matar a aventura.
A enorme onda do movimento constante da vida
é grande demais para ser evitada e ignorada
Na realidade, a mudança implica passar ou transitar de uma situação ou de um estado ou condição para outro. A mudança é uma passagem, uma travessia, uma virada que é tão animadora quanto ameaçante. Mudar implica desenraizar-nos ou distanciar-nos do “habitus” que nos constitui, ultrapassarmos os modos de sentir, pensar e agir fechados. A mudança envolve uma ruptura e uma perda do estado anterior. Mudar altera o hábito, o normal, a regra ou o modo como organizamos nossas vidas.
O sim à vida move, nos faz peregrinos
Há especialistas em encontrar obstáculos, fabricar pretextos, encontrar desculpas para não mudar. Se estamos apegados ao que temos e somos, jamais seremos capazes de fazer estrada com Deus e participar da preciosa vida que Ele nos oferece. Normalmente, a mudança acontece e se impõe às pessoas. Em momentos de crise, sobretudo, ocorre a ruptura inevitável com o “habitus”. Por isso é fácil perceber o medo e a resistência à mudança.
Mas, podemos “eleger a mudança”. A experiência dos Exercícios Espirituais coloca em xeque nossas práticas, convicções, crenças, hábitos de vida, e nos faz viver em permanente movimento e transformação. Sem movimento não há opção nem criatividade. A decisão audaciosa e inovadora poderá germinar outro mundo. Consequentemente, uma pessoa marcada pelos Exercícios é uma especialista em mudanças.
Ela tem como referência a pessoa de Jesus Cristo, e seguir Jesus implica percorrer um caminho de constantes rupturas e de travessias para o outro lado. Isso significa que, onde quer que estejamos, nossos pensamentos, palavras, gestos e ações são sementes de mudança e podem contribuir para que o Reino de amor, de justiça e de paz se realize cada vez mais plenamente.
Mudar é olhar de outra maneira a vida e suas circunstâncias
Viver a arte da mudança significa ampliar o olhar e reverter a tendência natural de ver a vida somente a partir de um ângulo. Cecília Meireles expressa assim: Renova-te. Renasce em ti mesmo. Multiplica os teus olhos, para verem mais. Multiplica os teus braços, para semeares tudo. Destrói os olhos que tiverem visto. Cria outros, para visões novas. Destrói os braços que tiverem semeado, para se esquecerem de colher. Sê sempre o mesmo. Sempre outro. Mas sempre alto. Sempre longe. E dentro de tudo.
Texto Bíblico: Mc 7, 24-30 / Mt 2, 1-11 / Lc 1, 12-23
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