Ronnaldh Oliveira
Artigo publicado na Revista Ekklesia Brasil
A sinodalidade tem sido cada vez mais a palavra da vez, do ponto de vista eclesial, relacional, profissional e pessoal. Diante dos avanços dos pensamentos, temos ainda entendido a necessidade da unidade para se chegar ao que sempre se entendeu ser Igreja.
A pergunta que certamente pode-nos inquietar é justamente o que é “ sempre se entendeu ser igreja” contido no parágrafo anterior. É certo que a humanidade de alguma forma contribuiu, com o auxílio do Espírito Santo para que se discernisse o que deveria ser a Igreja em cada momento presente. Vale ressaltar, entretanto, que o essencial continua o mesmo, as bases eclesiais não são sustentadas por gregos ou troianos, europeus ou latino-americanos, mas por todos. Este sempre foi o querer de Jesus, rosto humano de Deus.
Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância (cf Jo 10,10), Que todos sejam um, como tu, Pai, estás em mim e eu em ti: que também eles estejam em nós a fim de que o mundo creia que tu me enviaste (cf Jo 17,21).
Está na gênese eclesial a unidade de todos, a missão e a atuação frente a humanidade. O que por alguns momentos ocorreu, em nome da organização institucional foi a fragmentação desse “todos” para alguns, numa linha hierárquica que “manda quem pode, obedece quem tem juízo”, privilegiando poucos e saudando alguns. O termo “controladores da graça” e “alfândegas da fé’’ utilizado pelo papa Francisco em sua exortação apostólica Evangelli Gaudium exemplifica e evidencia o quanto nos distanciamos do pedido de Jesus.
O que muito nos alegra é saber que Deus nunca se enquadrará nas normas e estruturas impostas, nos estudos teológicos e antropológicos estudados que por vezes só nos dão títulos e pouca experiência pastoral. Nos escandaliza com sua bondade, dribla os critérios humanos e sempre arruma um jeito divino de escapar, a fim de continuar sendo pai de amor, da misericórdia e da presença significativa aos seus filhos, sobretudo os mais pobres e abandonados. O jovem de Nazaré soube se colocar com clareza e objetividade nos lugares que ia, no templo, entre os doutores, fariseus, saduceus, às multidões, aos pecadores etc. Erguido numa cruz, não traiu sequer um minuto sua vocação à unidade. Seu gesto na cruz, concretiza o amor doado a todos, sem reservas ou preferências.
As Juventudes contidas no todo da Igreja
Na sociedade contemporânea, já a alguns anos não falamos mais de juventude, mas referimo-nos juventudes no plural, na ciência existencial de que há diversas identidades juvenis. Os do Hip Hop, as partidárias, a das artes, da academia, dos estudos entre outros. Eclesialmente encontram-se também os jovens carismáticos, lectionaltas, focolarinos, os pertencentes aos movimentos das congregações religiosas, os de Maria, das pastorais sociais e afins. Tudo isso pra dizer que há muitos jovens engajados nas mais diferentes atuações e projetos.
A dinamicidade, a criatividade, o jeito novo e crítico de ver as coisas, a vivacidade do espírito, são próprios da vocação juvenil. Com suas vidas, colocam em cheque argumentos e estruturas a tempos já estabelecidas e inegociáveis, causando por vezes certa repulsa dos que estão nos espaços a mais tempo. Papa Francisco ainda em Evangelli Gaudium ressalta enfaticamente que a pastoral em chave missionária deve abandonar sempre o dito ‘’fez-se sempre assim’’, justamente para que além de se adequar aos tempos, chegar de fato ao coração das pessoas de hoje.
Pelo medo, receio ou por simplesmente entender os jovens como aprendizes inexperientes, sucateamos sua vocação de ser o “novo” de Deus hoje.
Dificilmente há a confiança de que podem ser profundos nas ações ou tampouco levados a serio. São mais uteis na venda de cartelas de shows de prêmios, acolhida e animação de eventos, bastidores tecnológicos de lives e encontros online2. Isso acontece não por maldade, mas por uma espécie de segurança de preservação pelo que já se tem, as “tradições” com “t” minúsculos.
Deve-se dizer que já existem muitas iniciativas que evidenciam as juventudes e suas potencialidades, mas ainda não é o bastante. O grande desafio está no caminhar junto, alinhar as ideias, dar oportunidades de crescimento, de evidenciar os dons, abrir espaços de escuta e de lideranças. Não há problemas em jovens liderarem mais experientes de vida. Assim também fez Jesus que liderou um grupo com pessoas com idade bem mais elevada que a sua e extramuros da instituição cristã é conhecido entre os terapeutas como o maior e melhor liderança já existente na humanidade.
As Jornadas mundiais das Juventudes, iniciadas por João Paulo II são sem sombra de dúvidas espaços privilegiados de reafirmar os laços de esperanças eclesiais de que os jovens terão de fato seus verdadeiros espaços no ser igreja em algum momento. O papa da juventude em um de seus discursos elucidou: “Não temam responder generosamente ao chamado do Senhor. Deixem que sua fé brilhe no mundo, que suas ações mostrem seu compromisso com a mensagem salvadora do Evangelho!”. Esse chamado será respondido dentro da comunidade de fé onde há pessoas que os acolham, acompanhem e permitam que tenham seus espaços de construção de quem são, amando a vida, junto do Senhor da vida.
O papa Francisco em mensagem enviada aos jovens que na ocasião estavam em uma vigília de oração na Itália, disse: “Queridos jovens, ao voltar para as suas casas e paróquias, não se deixem calar! Claro, quem fala pode errar, também os jovens, mas todos somos humanos e pecamos por imprudência! Mas, não tenham medo de errar e de aprender dos seus erros! Se alguém tentar tapar suas bocas, respondam que a Igreja e o mundo precisam dos jovens para se rejuvenescer”.3 Este pensamento continua a ressoar em toda a Igreja ainda hoje, sobretudo quando o assunto é sinodalidade.
Rejuvenescer espaços, rever estruturas e posturas em conjunto com aqueles que já estão na caminhada é de fato uma significativa pedagogia da existência da Igreja. Pensar nisso e não medir esforços para crescer, salvará a Igreja de ser um museu histórico que apenas conta aquilo que um dia já se foi, com a tristeza de não se dizer o que poderia ser. O que nos deve santamente motivar é ter a consciência de que o Espírito Santo continua suscitando jovens para o seguimento do Cristo. Cabe a cada cristão presente na comunidade, acolher e potencializar àqueles que chegam.
A Igreja abraçando a sinodalidade como projeto pedagógico, engaja as juventudes segundo já constam em seus documentos. Como na passagem bíblica da samaritana, cada jovem dentro da comunidade, pede de beber, por formação e oportunidades de confiança e engajamento de seus dons, sem repressões, olhares ‘’tortos’’ e excludentes. O Pai das Misericórdias chama a todos para uma experiência concreta de fé e amor conjunto. Não temos o direito de privar ninguém disso.
Pensar e construir juntos, pontes ao invés de muros, sendo constantemente arquitetos do amor, da ternura e da empatia, aliando as ferramentas da experiência e inovação, calmaria e agitação é tudo aquilo que sacia e dinamiza o espírito eclesial no chamado equilíbrio e brisa leve oriundo de Deus. O papel das juventudes crentes e não crentes na sinodalidade eclesial é ser sobretudo jovem, sem redundância, com poder de voz, de vez, de ação e articulação, Não de forma romantizada, utópica, mas concreta.
Os jovens precisam disso, desse espaço, dessa consciência de ser também esse seu lugar de ser quem se é. A Igreja precisa dar passos que com autenticidade procure rever prioridades, horários, projetos e acolhidas a partir de quem já é “de casa”, a humanidade precisa fortalecer e dar crédito de confiança encarando a Igreja como casa aberta do Pai! Lugar do Encontro de comunhão e unidade – mais que sinodalidade juvenil, sinodalidade como um todo. Somos todos Igreja. Apostemos nisso e avante!