O grito da natureza é a resistência de uma mulher que não se cala!

Escrito por Danniela Alves Rodrigues, Emiliana Pacheco Monteiro e Fernanda Campos Nazaré

As mulheres, na construção desta sociedade que discrimina, exclui e segrega, trava uma luta de resistência histórica, luta de reconhecimento de ser mulher e de ocupar todos os lugares da sociedade dos quais ela considera serem pertinentes para sua formação pessoal, profissional e social.

Assim como em diversos espaços e esferas sociais, na temática de Justiça Climática as mulheres encontram entraves que limitam sua voz nos ambientes de discussão e protagonismo social.

A vulnerabilidade de mulheres e meninas acerca dos desafios sociais inerentes a esta sociedade se pauta, principalmente, na falta de oportunidades de acesso e na limitação de recursos, além da ausência de representatividade nos espaços políticos.

E para nosso debate desta semana, é importante tornarmos consciência acerca do que é Justiça Climática. A justiça climática é o conceito adotado pelos movimentos socioambientais, muitos deles liderados por jovens ao redor do globo, para expressar a ideia de que a crise climática vai além do simples aquecimento global e das mudanças no clima, não sendo meramente um fenômeno físico e natural.

Esse termo ficou conhecido como o movimento global que busca uma distribuição mais equitativa de investimentos e responsabilidades no enfrentamento da crise climática. Trata-se de uma demanda para que as soluções para tal crise considerem as questões de justiça social, reconhecendo que a raiz do problema reside nas desigualdades socioeconômicas, as quais afetam de maneira desigual tanto as pessoas quanto os países, de acordo com seus recursos e níveis de vulnerabilidade.

A compreensão do meio ambiente e suas relações com o ser humano possibilita o entendimento de diversos acontecimentos climáticos, e com tais eventos atingem a sociedade de modos diferentes, causando impactos de enormes proporções, principalmente em lugares onde a desigualdade social e a pobreza são intensos.

E qual a relação da mulher com a justiça ambiental e climática? Por que este debate se faz necessário para buscar soluções eficientes para as questões climáticas?

A resposta para este questionamento se pauta no reconhecimento das lutas históricas que as mulheres enfrentam a séculos e nos diversos âmbitos, pois a luta das mulheres está relacionada ao combate das desigualdades e por soluções que inclua a todas e todos.

RECONHECIMENTO: DIREITOS, TRABALHO E CULTURA FEMININA

O reconhecimento da mulher enquanto ser social que dispõe de capacidade física e intelectual para planejar, administrar e executar políticas e ações em prol de melhores condições de vida para aquelas e aqueles que sofrem com as diversas assimetrias que colocam boa parte da sociedade em situação de pobreza e desproteção social é um caminho que vem sendo construído, por vezes a passos largos e lentos, mas que muito se percorreu, no entanto, ainda há um longo percurso a ser feito para a efetivação do reconhecimento da mulher na sociedade.

O papel que a mulher exerce na sociedade é amplo e complexo, com desafios que ultrapassam os níveis do trabalho e da vida profissional. Historicamente, a mulher foi vista como objeto, que estava a serviço do homem, dos cuidados domésticos e da educação dos filhos, do qual lhe era limitado e/ou negado o direito à educação, à cultura, ao lazer e a ter uma vida profissional de reconhecimento e remuneração pelo serviço prestado.

O IMPACTO SOCIAL DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

É indispensável neste debate compreender que para além das sequelas ambientais, as mudanças climáticas interferem direta e indiretamente na realidade social, uma vez que se sabe que os maiores responsáveis pela crise climática são os países desenvolvidos, que através dos altos níveis de emissão de carbono e outras substâncias que agridem o meio ambiente e provocam mudanças significativas na saúde, alimentação e poluição do ambiente socioambiental.

Segundo dados da COP 27, realizada no Marrocos, em 2022, os efeitos da crise climática causam impactos mais expressivos nos países em desenvolvimento, de modo especial, os países da América Latina e do continente Africano. Dados do site Iberdrola, são apontados 10 países com o maior nível de vulnerabilidade às mudanças climáticas. grande parte desses países vivenciam guerras e crises sociais e humanitárias, das quais as mulheres são afetadas severamente com a violação de direitos básicos e essenciais para a dignidade humana.

Este dado é apenas um exemplo dentre as tantas assimetrias que a crise climática tem provocado nos diversos aspectos da vida em sociedade. E esta realidade afeta a vida das mulheres de maneira desafiadora, é nesta prerrogativa que a ONU Mulheres Brasil declara que a mudança climática irá empurrar cerca de 158 milhões de mulheres e meninas para a pobreza até 2050, pois irá acarretar um aumento dos conflitos sociais, econômicos, políticos, culturais e ambientais.

“Se levarmos a sério o enfrentamento da crise climática, precisamos começar a ouvir e sentir a dor daqueles que sofrem as consequências já hoje” (Elizabeth Wathuti, ativista ambiental e climática queniana).

REPRESENTATIVA FEMININA NOS ESPAÇOS DE DEBATE DE JUSTIÇA CLIMÁTICA

Ao olharmos para a história da constituição nas sociedades atuais, nos deparamos com o silenciamento das mulheres, a violação de seus direitos e a exclusão destes dos diversos campos de debates. A luta das mulheres para ocupar espaços é histórica e contínua, hoje, muitas mulheres desfrutam do poder na tomada de decisões importantes para a sociedade, no entanto, reconhecemos que existe um longo caminho a ser trilhado para chegarmos ao ideal de uma sociedade justa e de igualdade, seja na área econômica, social, ou de gênero.

No final de 2023, em conferência climática da ONU, na COP 28 em Dubai, foi lançado um relatório da ONU Mulheres intitulado de “Feminist Climate Justice: Um modelo para ação”, onde traz dados pertinentes do impacto climático para as mulheres, não somente pelo pouco de espaço que tem para exercer seu protagonismo social, mas também pelo efeito que tem causado na sociedade, acarretando o aumento das desigualdades sociais e o avanço da pobreza para aqueles que já se encontram em níveis alarmantes de vulnerabilidades e desproteção social, do qual as mulheres têm sido as mais afetadas.

Ainda segundo dados da ONU Mulheres Brasil, as mulheres não têm representatividade significativa nos ministérios de proteção ambiental nos espaço nacional. A participação de mulheres nas delegações nacionais tiveram aumento para 35% até 2022, no entanto, houve diminuição no percentual de delegações liberadas por mulheres para as conferências climáticas COP da ONU.

Na reunião do G20 em 2023 foi criado o Grupo de Trabalho pelo Empoderamento de Mulheres, dentre as diversas pautas a serem debatidas pelo GT como desigualdade salarial de gênero e as diversas formas de violência, e debate acerca da justiça climática também foi listado nas atividades do GT.

Em em janeiro de 2024, ministrado e apresentado pela Ministra das Mulheres, Cida Guimarães e socióloga, Rosângela da Silva, que também é a atual primeira-dama do Brasil, o GT se reuniu por videoconferência para divulgar o plano de trabalho proposto para nortear as estratégias de ação no trabalho por igualdade de gênero e equidade social, garantindo o protagonismo feminino e dando voz a tantas mulheres que resistem aos mais diversos tipos de violações de seus direitos.

A RESISTÊNCIA DE MULHERES NOS ESPAÇOS DE JUSTIÇA CLIMÁTICA

De acordo com a ONU, estudos mostram repetidas vezes que as mulheres e meninas em situação de vulnerabilidade sofreram o maior impacto pelas mudanças climáticas e da perda de biodiversidade e poluição devido à sua idade, ascendência, etnia, raça, classe econômica e social, origem indígena, identidade de gênero, orientação sexual, status de imigração e deficiências.

Para começar a enfrentar esta crise socioambiental será necessário realizar uma abordagem sensível ao gênero e baseada nos direitos humanos que interpele as causas profundas da desigualdade, discriminação e marginalização, deixando espaço para as contribuições relevantes que todas as mulheres e pessoas com identidades de gênero diversas, afrodescendentes, indígenas, mulheres negras, mulheres migrantes, jovens e meninas, bem como mulheres com deficiência. Por isso, a mudança climática é uma crise de direitos humanos que exige uma resposta feminista.

As alterações climáticas já tiveram diversos impactos no meio ambiente e na vida das populações, especialmente nas mulheres e meninas dos países mais pobres. Diariamente, elas enfrentam as consequências das mudanças climáticas e têm buscado soluções para restaurar seus territórios, contribuindo para o desenvolvimento das comunidades.

Tornar-se cada vez mais necessário investir na participação das mulheres na vanguarda da luta contra as mudanças climáticas, pois, isso significa investir na justiça climática e na reparação das desigualdades, já que as populações mais vulneráveis, especialmente mulheres e meninas, são as mais afetadas pelas mudanças climáticas no Brasil, uma vez que estas acerca de 51,1% da população do Brasil, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Ainda há um longo caminho a percorrer, visto que a COP 27, sob o prisma das mulheres, registrou pequenos avanços seguidos por muitos obstáculos. Incluir gênero e raça, considerando suas interseccionalidades, torna-se não apenas necessário, mas imprescindível, uma vez que estes grupos são os mais afetados e porque a preservação ambiental está intrinsecamente ligada aos Direitos Humanos. Aqueles em situação de maior vulnerabilidade já possuem diversas soluções e merecem ser incluídos nelas.

Dessa forma, mesmo com os obstáculos já pudemos perceber um caminho trilhado e mesmo com a pouca representatividade de mulheres em cargos de decisão, as mulheres em todos os espaços, conseguem fazer mudanças estruturais e quando se estendem ao espaço climático precisam ser ousadas em seu engajamento e poder. Líderes mulheres são particularmente bons nisso por não terem outra opção para sua forma de ação.

MULHERES COM VOZ ATIVA NO DEBATE CLIMÁTICA E SOCIOAMBIENTAL

Jahzara Oná: Ativista socioambiental, estudante de geociências, membro da Ambipar Group e representante do ‘’Fridays For Future’, movimento criado por Greta Thunberg.

Mikaelle Farias: Ativista Climática, estudante de Engenharia de Energias Renováveis, representante da secretaria Geral da ONU no combate à desinformação sobre clima.

Tainá de Paula: Secretária do Meio Ambiente e Clima do Rio de Janeiro, membro da Comissão de Gênero do CAU-RJ, Coordenadora Regional do Projeto Brasil Cidades e Conselheira do Centro de Defesa e Direitos Humanos Fundação Bento Rubião e da ONG Rede Nami.

Sonia Guajajara: Ministra dos povos indígenas do Brasil, sua luta histórica pelos direitos dos povos originários e pelo meio ambiente.  Tem reconhecimento internacional na defesa dos direitos dos povos indígenas, seus territórios e causas socioambientais.

Marina Helou: Deputada estadual pela Rede Sustentabilidade em São Paulo, fez parte da Bancada Ativista e do Movimento Acredito e co-fundou a organização Vote Nelas, em prol da participação de mais mulheres na política. É membro da RAPS e do Renova BR.

Referências:

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