“Bem-aventurado aquele que ri gentil e alegremente de si mesmo e convida os outros a fazer o mesmo, elevando uma canção de alegria a Deus, o Pai” (Roger Poudrier)

Na História Sagrada não faltam alegria, humor, riso, porque ela é uma Boa Nova de salvação. O cristão pode ter a ousadia de ser cheio de alegria, exuberante, ou deve cultivar uma religião de ansiedade, em que seria sempre normal ter uma consciência pesada? O clima normal da vida cristã deve ser o de constrangimento?

Se Deus é Amor, também é humor, para permitir que o ato de fé do ser humano possa expandir-se numa formidável risada para a glória do Pai. Se Deus é triste, que triste Deus! Aquele que criou a exuberância do mundo andaria de cara amarrada? Aquele que criou o riso não riria? E se a Criação fosse unicamente as ondas do riso de Deus repercutindo até os limites de um universo em expansão?

Deus nosso Pai nos proporciona uma infinidade de ocasiões de rir e nos regozijar. A vida nada tem de espetáculo lacrimejante, mas é tecida de humor e situações divertidas, ridículas, risíveis. Se a vida é um presente de Deus, seria esse presente envenenado, um vale de lágrimas, em que os suicidas teriam razão? Podemos olhar nossa vida com olhos de sexta-feira santa e ver tudo escuro, ou optar por olhos de Páscoa e ver tudo na glória. Assim, a humanidade inteira tem de que rir, pelo tempo e pela eternidade, pois o dom gratuito de Deus é a vida eterna.

Filhos do riso, descendentes da promessa

Somos filhos da Ressurreição, da transfiguração, criaturas da luz. Tudo termina nos acordes majestosos do grande aleluia pascal. O humor é um sério fator de equilíbrio, pois ele nos ajuda a tomar distância de nós mesmos, a colocar todas as coisas em perspectiva e a desdramatizar os acontecimentos. Muitas vezes o humor consiste em suscitar um novo aspecto, uma significação inesperada, uma dimensão imprevista, de modo que toda a tragédia não demora a voltar à eterna comédia da vida.

O humor é uma forma de protesto

O humor dissimula uma nota subversiva, porque faz perguntas impertinentes, aponta o absurdo de certas respostas, na aparência razoáveis, e o ridículo dissimulado por trás do solene. Destaca a incerteza que envolve toda certeza e realça o lado risível das afirmações ditas evidentes, dos princípios tidos como imutáveis, das verdades pretensamente objetivas. “É possível que rir seja simplesmente o maior recurso espiritual à nossa disposição. Em nosso riso, damos voz a toda tragédia e alegria da sobrevivência humana no front da guerra da vida. Talvez seja a risada a imagem de Deus dentro de nós. O riso volta-se para o futuro e para o bem da vida, mesmo quando não há nenhum. Sem humor, estamos todos em risco de perder o caminho. Ele é o dom dos anjos, mas até estes tem inveja do modo como o desenvolvemos.”

Em suma, o humor relativiza tudo. O humor diz a verdade e despoja coisas e pessoas de aparências enganosas. Transforma-se num modo de viver e morrer. Conduz à fé, pois é o dedo que aponta na direção certa. O humor permite que não nos liguemos demais às coisas sérias, e menos ainda às trágicas.

O sorriso e o riso têm qualidades  medicinais comprovadas

O humor permite ainda rir dos acontecimentos infelizes restituindo-os à sua posição no grande tecido da existência. O melhor humor tem um traço de “autozombaria”. Ele atravessa as besteiras e alivia a implacável seriedade da existência cotidiana. A seriedade não é nem uma virtude nem um vício, mas um simples pendor natural. É muito mais fácil tomar-se a sério que aprender a rir de si mesmo. O maior egoísmo é se levar muito a sério. Quem se toma a sério e faz de si mesmo o centro, o humor põe em risco sua couraça e alfineta o seu balão, esvaziando.

Texto Bíblico: Ecl 30, 21-25  /  Ecl 11, 7-10  /  1Ts. 5, 16-18

 

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