Fé que Não se Apaga: Os Mártires das Missões e o Chamado que Continua 

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Fé que Não se Apaga: Os Mártires das Missões e o Chamado que Continua 

Ir. Douglas Turri, SJ

Chamados a amar sem fronteiras 

Os Santos Roque González, Afonso Rodríguez e João de Castilho foram jovens jesuítas que entregaram suas vidas ao Evangelho com uma coragem que atravessa séculos. São Roque, nascido em Assunção em 1576, foi o primeiro dos três a entrar para a Companhia de Jesus e tornou-se parte da primeira missão jesuíta em sua terra. Profundamente comprometido com o povo guarani, aprendeu sua língua, conviveu com suas tradições, incorporou sua cultura e passou a ser reconhecido como um verdadeiro pai entre eles. Quis não apenas evangelizar, mas colocar seus talentos e sua própria vida a serviço da dignidade indígena, ajudando a criar espaços de liberdade e protagonismo em meio ao contexto duro da colonização. 

Nesse caminho, São Roque encontrou dois companheiros mais jovens que viriam a partilhar sua missão e destino. São Afonso Rodríguez — espanhol de Zamora — ingressou na Companhia movido por profundo desejo missionário. Deixou sua pátria aos 18 anos, estudou em Córdoba e foi enviado às reduções do Rio da Prata, como uma resposta concreta ao chamado de levar a Boa Nova a terras distantes. Ao chegar à missão, reconheceu em São Roque um verdadeiro mestre espiritual e apostólico; caminhou ao seu lado com entusiasmo juvenil, desejoso de aprender a servir como ele servia. 

São João de Castilho, também espanhol, nascido em Belmonte, havia começado estudos de Direito antes de optar pela vida religiosa. Entrou no noviciado em Madri e, pouco depois, embarcou para a América do Sul. Era um homem sensível, sereno, capaz de escutar e reconciliar — um dom precioso em terras marcadas por disputas e interesses conflitantes. Ordenado sacerdote em 1624, dedicou-se às novas fundações missionárias com espírito generoso, cuidando do povo com proximidade e fé. 

A missão que protegeu a dignidade 

A missão das reduções foi uma das iniciativas mais transformadoras da história da Companhia de Jesus. Ali, os missionários buscavam integrar o anúncio do Evangelho ao respeito pela cultura guarani, promovendo uma evangelização que não destrói, mas valoriza e dá protagonismo às expressões próprias daquele povo. Era um projeto civilizatório alternativo à lógica de exploração: educação, música, trabalho comunitário, expressão cultural e prática da fé caminhavam juntos. Por isso mesmo, despertava a ira de quem lucrava com a opressão e o medo de alguns líderes que se sentiam ameaçados. 

Um martírio que acendeu esperança 

Foi nesse contexto que o martírio veio ao encontro desses três companheiros. Em novembro de 1628, enquanto trabalhavam na fundação de uma nova redução — a Missão de Todos os Santos — São Roque González e São Afonso Rodríguez foram brutalmente assassinados na região de Caaró, no atual estado do Rio Grande do Sul. Dois dias depois, São João de Castilho, rezando em Itapuã, foi capturado, torturado e morto na mata, próximo de Ijuí. Seus corpos foram queimados, mas a chama da fé que acenderam jamais se apagou. 

Entre as cinzas da capela destruída, o coração de São Roque foi encontrado intacto — um sinal de que o amor que dá a vida não pode ser vencido pela violência. Em 1934, os três missionários foram beatificados pelo Papa Pio XI e, em 16 de maio de 1988, canonizados por São João Paulo II como os primeiros mártires das Américas. 

Uma inspiração que chega até nós 

Hoje, São Roque, São Afonso e São João de Castilho continuam a nos inspirar. Eles nos recordam que a fé verdadeira é aquela que se compromete com os mais vulneráveis, que enfrenta a injustiça com coragem e que ama mesmo quando isso exige sacrifício. 

Como eles, somos chamados a sermos presença de esperança, a valorizar culturas e comunidades muitas vezes feridas por diferentes formas de exploração, a cultivar vínculos de respeito, proteção e cuidado. A vocação — qualquer que seja — encontra sua verdade quando gera vida e amplia a liberdade do outro. 

Que o testemunho desses mártires das missões reacenda em nossos corações o ardor pela verdade, pela justiça e pelo Evangelho. Que, como eles, possamos viver a fé com integridade, coragem e amor — custe o que custarChamados a amar sem fronteiras 

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