Por Pe. Alexander Zatyrka Pacheco, SJ

Durante seu tempo convalescente em Loyola, Santo Inácio descobriu um mundo que não conhecia: a dimensão da interioridade. A maior parte de nossas vidas a vivemos na superficialidade de nosso discurso mental, que nos mantém permanentemente distraídos. As urgências, que se sucedem uma após a outra, não nos deixam tempo para ponderar sobre o que é verdadeiramente importante: Minha vida tem sentido? Sinto-me plenamente feliz? Sei para onde quero ir e para quê?

Nos seus momentos de solidão, com a mobilidade extremamente limitada, Santo Inácio teve que enfrentar essas perguntas. Como muitas outras pessoas, tentou evitá-las distraindo-se em mundos fantásticos, imaginando ser um dos cavaleiros dos romances de ação da época, que tanto gostava. Até imaginava como os reconhecimentos que receberia por sua valentia na defesa de Pamplona o aproximariam de algum modo daquele ideal fictício.

Os estudiosos da vida de Inácio consideram que duas leituras foram especialmente importantes para conduzi-lo ao caminho da interioridade: a vida de Cristo do cartuxo Ludovico de Saxônia e as vidas dos santos. O cartuxo havia escrito um texto inovador. Não apenas um relato da vida do Senhor baseado nos quatro evangelhos — que já eram comuns anteriormente — mas um verdadeiro manual de oração interior. Ao final de cada cena da vida de Jesus, Ludovico recomendava recriar o lido com a imaginação e tentar experimentar o que teriam vivido aqueles que estiveram fisicamente presentes no evento descrito.

Seu objetivo não era apenas informar seus leitores sobre os fatos da vida de Jesus — lembrando que os evangelhos eram inacessíveis à maior parte das pessoas que não sabiam latim —, mas fazer com que o leitor interagisse com os conteúdos existenciais do relato evangélico, que se deixasse interpelar pelas palavras e ações do Senhor. E, finalmente, que tirasse conclusões aplicáveis ao concreto de sua vida.

Por meio desse método, que poderíamos descrever tecnicamente como uma oração de contemplação temática, para Inácio a pessoa de Jesus deixou de ser um conceito para se tornar uma presença, e uma presença que se comunicava com ele. Percebeu que ao final desses encontros de oração seu estado de ânimo se transformava. Emoções já conhecidas, como alegria, entusiasmo, determinação, etc., alcançavam uma profundidade e nitidez que nunca haviam tido antes. Pôde comparar as “deleitações” superficiais e passageiras de seus devaneios mundanos com a consolação que só pode vir de ter descoberto o verdadeiro amor.

Essas primeiras incursões na interioridade, isto é, na tomada de distância do caos habitual de nossa sequência de discursos mentais, permitiram-lhe descobrir o mundo do silêncio interior. Quando nos emancipamos da tirania da mente e começamos a levar a consciência ao coração, captamos ideias (“luzes”) que nos permitem entender a vida de maneira mais completa e verdadeira. Deixamos para trás uma visão fragmentada do mundo para descobrir como tudo está vinculado através do dinamismo que o integra: o amor ágape. No coração também percebemos padrões de comportamento (“moções”) que nos ajudam a encarnar esse amor no concreto de nossa cotidianidade.

Em suas contemplações bíblicas, Inácio aprendeu a deixar para trás os impulsos de seu ego para se aproximar, de mãos dadas com Cristo, de sua verdadeira identidade (sua vocação), ou seja, sua maneira particular e única de transparecer o amor de Deus. Experimentou como o Senhor lhe revelava os sentimentos que o moviam naqueles momentos relatados pelos trechos bíblicos (“conhecimento interno”). Ou seja, começou a acessar o sentir de Jesus. E, o mais importante, Inácio foi percebendo que os sentimentos de Jesus também habitavam nele. Quando sua consciência podia entrar em ressonância com essa verdade — o Cristo que vivia nele —, Inácio sentia uma felicidade profunda e abrangente.

A esse estado de ânimo ele chamou consolação. Sua característica principal era a vivência da comunhão plena com Deus através do amor compartilhado (“a alma se inflama em amor de seu Criador e Senhor”). Foi perceber que Deus estava apaixonado por ele e que Inácio amava a Deus com um forte impulso de reciprocidade.

Em suas regras de discernimento de espíritos da primeira semana, Santo Inácio descreve também outras manifestações indicativas desse estado: dor ao lembrar as vezes em que não havia sido consciente do amor de Deus, dor ao perceber “que o amor não é amado”, e dor pelas feridas que causou e se causou a partir dessa situação de cegueira. E é que o conhecimento interno do Senhor Jesus desmascara tudo em nós que “não é Ele”. Isso dói profundamente — é a fonte da compunção — e o princípio de todo processo autêntico de conversão.

Estar em consolação, ou seja, viver a partir deste vínculo íntimo com o Deus que nos ama, leva naturalmente a sentir que aumentam em nós as três virtudes teológicas: fé (confiança), esperança (certeza) e, sobretudo, caridade (amor concreto que vincula à pessoa amada). A pessoa se sente integrada, sustentada e habilitada a ser colaboradora ativa e eficaz na construção do projeto de Deus: a comunhão do amor compartilhado.

A vida espiritual e a experiência da oração como elemento central dela são um itinerário permanente de crescimento e transformação. O Inácio convertido, embora tenha claro que quer orientar toda a sua vida ao serviço de Cristo e do Reino, não terminou de ser moldado por sua relação com o Senhor. Isso levará muitos anos. A companhia próxima do Senhor Jesus, a quem Inácio buscava e cuidava todos os dias, foi transformando seu voluntarismo em determinação, sua obstinação em tenacidade, sua precipitação em prudência, sua arrogância em humildade.

Uma escola especialmente dura e frutífera foi seu tempo em Manresa. Sua vida de eremita, com a multiplicação dos tempos para estar disponível à comunicação terapêutica de Deus, acelerou o processo de passar de uma consciência governada pelo ego autorreferencial para uma consciência radicada no coração, o lugar do encontro com o Deus vivo. Quase perdeu a vida na tentativa. De maneira indicativa, o que o salva da morte certa para a qual seu ego o levava é precisamente a abertura ao outro. Comenta em sua autobiografia que chegou a estar disposto a deixar-se conduzir até por um “cãozinho” se isso lhe permitisse escapar desse beco sem saída. Inácio descobre um Deus surpreendentemente próximo e comprometido com ele, que “o ensina como um mestre ensina a uma criança”.

Liberado da prisão do ego, Inácio pode iniciar seu itinerário à santidade, à plenitude de nossa condição humano/divina. É o caminho de descobrir que Deus com seu amor sustenta o mundo e o vivifica constantemente. Essa vivência culminante da vida espiritual é descrita por Inácio em sua Contemplação para Alcançar Amor. O amor divino é um amor concreto, de realidades e não de boas intenções (“mais em obras que em palavras”). Para que seja real é necessário que se manifeste no tempo e no espaço. E ele faz isso através da entrega dos dons e talentos que temos à nossa disposição (“dar do que tem e pode”), a partir do desejo de vê-los convertidos em bênção para a pessoa amada. Viver sempre a partir da convicção e do estado de “em tudo amar e servir”.

Inácio resume esta meta do caminho cristão no texto que se conhece como oração de Santo Inácio (“Tomai, Senhor, e recebei…”). Nela, ele pede a Deus, que o ama, que tome em primeiro lugar a sua “liberdade”, o dom mais precioso da condição humana. Quer assim viver em permanente sinergia — união de vontades — com o Deus vivo. Depois pede que receba todo o seu ser racional, simbolizado em suas três faculdades: memória, entendimento e vontade. De alguma forma descreve assim toda a sua pessoa para depois acrescentar seu “ter e possuir”, todos os bens que tem à sua disposição.

Inácio reconhece nesta oração que tudo vem de Deus. Agora lhe devolve esses dons a Ele, mas enriquecidos com o seu próprio amor. O compromisso é se entregar a si mesmo para se tornar vida da pessoa amada. Sabe que é um exercício difícil, mas já conhece a chave: o amor e a graça de Deus bastam para tornar real esse estado de vida.

Em suma, poderíamos dizer que o itinerário orante de Inácio, centrado no conhecimento interno — a partir da interioridade — do Senhor Jesus, nos leva a descobrir nossa verdade — a vocação para amar — e desmascarar a mentira que nos impede de vivê-la plenamente. É descobrir nossa vocação — a maneira como Cristo vive em mim — e escolhê-la. Acostumar-nos à comunicação permanente com o Senhor para agir em autêntica sinergia: percebo que quero o que Tu queres, Senhor. Isso nos capacita para viver encarnando a vontade de Deus que se traduz em uma felicidade plena (consolação).

Orar à maneira de Inácio se cristaliza finalmente na pergunta fundamental do discernimento cristão: Como queres, Senhor, que amemos hoje?

(Traduzido do artigo publicado na Revista Christus)

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