“Em Manresa pedia esmola cada dia. Não comia carne nem bebia vinho, mesmo que lhe dessem. Nos domingos não jejuava e se lhe davam um pouco de vinho, bebia-o. E porque tinha sido muito vaidoso em cuidar do cabelo, como era costume naquele tempo, e ele o tinha muito bonito, resolveu deixá-lo à sua natureza, sem o pentear nem cortar, nem cobri-lo com alguma coisa, de noite e de dia. E pela mesma razão deixava crescer as unhas das mãos e dos pés, porque também nisto fora vaidoso” (Aut 19).
Escrito por Pe. Ednaldo Rodrigues Vieira, SJ
Após ser ferido pela bala de canhão, Inácio através das leituras da vida Cristo e da vida dos Santos confronta sua vida com estas ideias e deseja mudar. Sente que quando pensa em seguir sua careira de cavaleiro fica feliz, mas o desejo de seguir a Cristo deixa uma alegria mais duradoura e profunda, sonha em ir a terra santa, mas antes passa um ano de busca de Deus e de si em Manresa.
Arrepende-se de sua vida passada e começa a fazer penitência, embora de forma irrefletida maltrata seu corpo através de penitências corporais até descobrir que sua mudança de vida está para além disso, confrontando-se com sua situação de afastamento de Deus coloca-se frente ao crucificado perguntando: “Que fiz, que faço e que farei por Cristo” (EE 53). Reconhecendo-se pecador amado retoma seu caminho.
A cantora Flaira Ferro na música “me curar de mim” faz um percurso espiritual-psíquico de mudança de rumo, como Inácio mergulha no pior de si para emergir no melhor que pode ser:
Mas se eu não tiver coragem
Pra enfrentar os meus defeitos
De que forma, de que jeito
Eu vou me curar de mim?
Se é que essa cura há de existir
Não sei. Só sei que a busco em mim
Só sei que a busco
Me curar de mim
Num primeiro momento Inácio mergulha em escrúpulos que o levam próximo ao suicídio (Aut 24), mas pouco a pouco vai fazendo a experiência de um amor que o leva a vida plena, sentindo-se perdoado e amado. Agora seu sonho é partilhar tudo o que viveu na sua sede de ajudar as almas. Começa sua peregrinação primeiramente física (ir a Jerusalém), depois espiritual na busca da vontade de Deus; peregrinação que durou a vida inteira.
Inácio, o peregrino fez uma longa peregrinação até seu interior como dizia Drummond:
“só resta ao homem
(estará equipado?)
a dificílima dangerosíssima viagem
de si a si mesmo:
pôr o pé no chão
do seu coração
experimentar
colonizar
civilizar
humanizar
o homem
descobrindo em suas próprias inexploradas entranhas
a perene, insuspeitada alegria
de con-viver.
E você está disposto/a a fazer esta viagem? Deus te ama como você é, suas possibilidades e limites, alguns limites você pode superar outros acolher e quem sabe usá-los a seu favor. E como Manoel de Barros possa dizer: “todas as coisas apropriadas ao abandono me religam a Deus”.
No meu campo interior o que é joio ou o que é trigo, como convivo com os dois? Ou que fragilidade pode me religar a Deus?
Textos bíblicos: Mt 13,24-30 e 2 Cor 12,10-12
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