Eco-espiritualidade: ser e sentir-se Terra

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O termo ecologia não se refere apenas a uma “ecologia exterior”, ou seja, aos ecossistemas em seu instável equilíbrio. Engloba também toda uma “ecologia interior”, própria do ser humano: o universo de sua psique, de seus afetos, de sua espiritualidade, de suas relações básicas, quer consigo e com os outros, quer com o mundo e com Deus.

Pertencemos à Terra, somos filhos e filhas da Terra. Somos Terra. O ser humano vem de húmus. Viemos da Terra e voltaremos à Terra. A Terra não está à nossa frente como algo distante e diferente de nós mesmos. Temos a Terra dentro de nós. Somos a própria Terra que, ao evoluir, chegou ao estágio de sentimento, de compreensão, de vontade, de responsabilidade e de veneração. Somos a Terra no seu momento de auto realização e de autoconsciência.

Somos Terra que pensa, sente, canta e ama

Não há, portanto, distância entre nós e a Terra. Formamos uma mesma realidade complexa, diversa e única. Humanidade e Terra, formamos uma única realidade esplêndida, reluzente, frágil e cheia de vigor. Somos formados com as mesmas energias, com os mesmos elementos físico-químicos dentro da mesma rede de relações de tudo com tudo, há mais de 15 bilhões de anos. Os elementos químicos da Terra circulam por todo o nosso corpo, sangue e cérebro. Temos no corpo, no sangue, no coração, na mente e no espírito os elementos da Terra.

Dessa constatação, nasce a consciência de profunda unidade e identificação com a Terra e com sua imensa diversidade. Somos um com ela. Numa perspectiva unitária, aquilo que aparentemente está fora de nós, na verdade encontra-se cravado dentro de nós. Por exemplo, toda violência ao meio ambiente, no passado ou no presente, repercute em nossas estruturas mentais e afetivas, deixa traumas no inconsciente coletivo.

Por sentirmos filhas e filhos da Terra, por sermos a própria Terra pensante e amante, devemos vivê-la como Mãe. Ela é um princípio generativo. Representa o feminino que concebe, gesta e dá a luz. Ela tudo acolhe e tudo recolhe em seu seio. Ao morrermos, voltaremos à Mãe Terra, regressaremos ao seu útero generoso e fecundo.

Sentir que somos Terra faz-nos ter os pés no chão, faz-nos perceber tudo da Terra: seu frio e calor, sua força que ameaça bem como sua beleza que encanta. Sentir a chuva na pele, a brisa que refresca, o tufão que assusta. Sentir na respiração o ar que nos entra, os odores que nos embriagam, as cores que nos assombram. Sentir a Terra é sentir seus nichos ecológicos, captar o espírito de cada lugar, inserir-se num determinado lugar percebendo sua sacralidade.

Ser Terra é sentir-se habitante de certa porção de terra. Ser Terra significa nossa base firme, nosso ponto de contemplação do todo, nossa plataforma para poder alçar voo para além dessa paisagem e desse pedaço de terra, rumo ao Todo infinito. Sentir-se Terra é perceber-se dentro de uma complexa comunidade de seres vivos. É a diversidade incontável de seres vivos, animais, pássaros e peixes, nossos companheiros dentro da unidade sagrada da vida. Para todos a Terra produz condições de subsistência, de evolução e de alimentação, no solo, no subsolo e no ar.

Terra, nosso lar comum

Sentir-se Terra é mergulhar na comunidade terrenal, todos filhos e filhas da grande e generosa Mãe. A experiência dos Exercícios Espirituais significa, portanto, “mergulhar os pés na terra” (Lv 25, 1-24). É na obscuridade da terra que a planta vai buscar a força que a manterá viva, que lhe dará condição de expandir sua copa em direção à imensidão do céu. As raízes mergulham na terra de modo profundo, silencioso e lento. No chão, à primeira vista, estão todas as sujeiras, os detritos e as coisas em decomposição. Mas, para as raízes, tudo isso significa a origem da vida.

Na experiência espiritual nos é pedido que mergulhemos no chão da vida, como as raízes na obscuridade, na presença do silêncio. O movimento de enterrar profundamente as raízes possibilita alcançar a seiva, o pulsar da vida e o equilíbrio. Sentir que somos Terra faz-nos ter os pés no chão da vida e viver em comunhão com a comunidade das criaturas. A hora é de somar em prol da vida e no cuidado de todos os seres da Terra.

Faz-se necessário lançar raízes no mais profundo da nossa humanidade e despertar todas as energias criativas, todas as grandes motivações adormecidas, toda bondade aí presente, toda decisão de assumir-se como cooperador e artífice de um novo tempo. Dessa consciência brota o louvor, a reverência e o serviço. É para Deus que tudo converge. É Ele que tudo sustenta. É Ele que, no Amor, tudo atrai.

Texto Bíblico  Lv 25, 1-24

 

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