“E assim foi ao hospital e depois, na hora conveniente, saía à procura de esmola pelo povoado” (Autobiografia, 87).

Escrito por Pe. Ponciano Petri, SJ

Inácio já estava amadurecido em experiências espirituais quando entende que precisava ser ajudado em assuntos pessoais. Encontrava-se enfermo e acolheu as orientações de que os ares de sua terra natal o fariam muito bem. E partiu rumo à Azpeitia, de onde havia saído anos antes. Retornou um homem modificado internamente, fruto de sua intimidade com o Senhor, por orações e outras práticas espirituais. Empregou o caminho de volta para o lugar onde decidiu renunciar às “vaidades do mundo”.

O Peregrino entrou e permaneceu em sua terra como um desconhecido: realizou a viagem sozinho; percorreu o caminho menos conhecido; não se dirigiu à casa de seu irmão, mas sim para um hospital pobre à entrada dos domínios dos Loyola. Fato este que causou surpresa aos de sua família. Esta estratégia revela o desejo de reconciliar-se com suas práticas passadas e que, no momento em que vivia, julgou ser má conduta e mal exemplo aos seus conterrâneos. Sua transformação foi radical e não permitiu que alguma lembrança de seu antigo estilo de vida colocasse dúvidas sobre as renúncias que tinha realizado. Elege conscientemente romper com aquilo que o conduzia a “ganhar o mundo, mas perder-se”.

Estar em sua terra natal poderia oferecer a Inácio benefícios pelos quais ele rejeitou. Os empregados de seu irmão “se esforçaram muito para levá-lo à sua casa”, mas não conseguiram. Ele preferiu, mais uma vez, o anonimato e a liberdade para poder realizar seus ministérios. Evitou ambientes e situações que poderiam chamar a atenção para si, saindo somente “à hora conveniente”. Fez companhia aos pobres e humildes. Entendeu que para curar o corpo precisava eleger aquilo que permitisse ao espírito estar sadio.

Todos estes fatos devem ser vistos, também, à luz do voto de pobreza que Inácio e seus companheiros fizeram, ainda estando em Paris. Um juramento sagrado escolhido depois “de longas orações, penitências e jejum”. Era preciso cumprir com a mesma seriedade que cumpria todas as coisas que julgava ser da vontade de Deus. Dessa maneira, os ares de sua terra fizeram bem maior: ali reconheceu ser capaz de viver seus propósitos e confirmou serem verdadeiras suas intenções de renunciar aos bens passageiros. Vincular seu estado de vida atual à obediência da vontade de seu Criador e Senhor, fez do Peregrino Inácio homem pleno de confiança da graça Divina.

Os Exercícios Espirituais oferecem para nós a oportunidade de confirmarmos nosso desejo de seguimento a Jesus Cristo. Um caminho espiritual capaz de ordenar nossos afetos e colocar nossa confiança em Nosso Senhor. Quando permitimos ao Espírito Santo agir em nós, entrando no processo de amadurecimento interior, Ele mesmo nos alcança com Sua graça transformadora. Brota dessa comunhão de amor o autêntico serviço e uma vida entregue ao projeto do Reino de Deus.

Assim, somos interpelados a fazer memória de nossa história e identificar os sinais que o Senhor nos tem apresentado. Quais “caminhos” tenho percorrido? Eles me levam à liberdade interior, mãe e mestra de nosso relacionamento autêntico com a Santíssima Trindade? As escolhas que tenho feito me ajudam no maior amor e serviço?

Texto Bíblico: Mc 10, 17-23 | Fl 3, 8-14

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