Espiritualidade Agostiniana e juventudes: os novos ventos na Igreja com o Papa Leão XIV 

Compartilhe :
Facebook
Email
X
LinkedIn
WhatsApp

Em um momento de grande expectativa para a Igreja Católica, a eleição do Papa Leão XIV marca não apenas a continuidade do pontificado, mas também uma novidade histórica: ele é o primeiro Papa agostiniano da era recente. Essa eleição traz para o centro do debate eclesial a espiritualidade e o carisma da Ordem de Santo Agostinho, que têm muito a contribuir para os desafios contemporâneos da Igreja, especialmente no diálogo com as juventudes. 

O pontificado do Papa Leão XIV, ainda em seu primeiro mês, tem mostrado sinais claros de um estilo pastoral marcado pela busca da Verdade, pela comunhão e por uma inquietude profunda que acompanha o caminho de Santo Agostinho. Em um mundo marcado por crises de sentido, complexidade das relações e um ambiente digital cada vez mais presente na vida dos jovens, essa espiritualidade parece oferecer respostas fundamentais para uma fé relevante e transformadora. 

Para aprofundar essa reflexão, conversamos com Fr. Gutemberg de Albuquerque Machado, religioso da Ordem de Santo Agostinho e conselheiro provincial para Educação e Assistência. Fr. Gutemberg compartilha sua experiência na missão da Ordem com as juventudes, seus desafios e aprendizados, além de destacar como os pilares agostinianos — interioridade, vivência comunitária e serviço à Igreja — moldam o estilo de vida dos jovens hoje e podem inspirar o caminho pastoral deste novo pontificado. 

Esta entrevista é um convite para entendermos melhor como o carisma agostiniano se coloca como luz e caminho para a missão da Igreja, especialmente no acompanhamento das juventudes, em um tempo que pede respostas autênticas, comunhão e propósito. 

MAGIS Brasil: A espiritualidade agostiniana tem como pilares a interioridade, a vivência comunitária e o serviço a Igreja. Como esses elementos moldam a missão da Ordem de Santo Agostinho na Igreja hoje e que contribuições oferecem à vida cristã das juventudes? 

Frei Gutemberg: Esses três pilares do carisma Agostiniano são uma tradução daquilo que Santo Agostinho viveu em toda a sua vida, principalmente após a sua conversão.  

Como sabemos, a Ordem de Santo Agostinho não foi fundada pelo próprio Bispo de Hipona, e sim pela Igreja, por meio do Papa Inocêncio IV que reuniu todas as comunidades que viviam a regra de vida deixada pelo próprio Agostinho para formar o que hoje é conhecida Ordem de Santo Agostinho. 

Esses pilares (Interioridade, Comunidade e Serviço a Igreja) moldam completamente o estilo de vida daqueles que desejam realizar o seguimento de Jesus a partir da espiritualidade Agostiniana, pois ao olhar a história de vida de nosso Pai Santo Agostinho, também nós, os frades agostinianos, somos convidados a dar continuidade ao legado deste grande homem que contribuiu com tanto ardor dentro e fora da Igreja. 

Ao olhar para nossa realidade, constatamos em nossas pastorais juvenis que Santo Agostinho ainda dialoga com os jovens de nossa época, pois assim como Agostinho eles buscam o sentido da vida, a sua verdade, em tantos lugares, coisas e pessoas, e ao se depararem com a história desse grande homem percebem que a Verdade não está fora e sim dentro: esse Deus que não é distante, pelo contrário, habita dentro de nós! Por isso, a espiritualidade agostiniana ajuda para que o jovem não se distraia com um mundo externo e volte para dentro de si, num caminho de autoconhecimento e busca de Deus. Esse caminho não é feito só, é feito em comunidade. Assim como Agostinho que ao descobrir a Verdade (Deus) de sua vida levou todos os seus amigos a essa mesma experiência, assim os nossos jovens buscam viver essa experiência de fé à luz da Palavra de Deus e dos Sacramentos em comunidades (grupos) não para viverem apenas uma fé intimista ou isolada, antes, para se fortalecerem e se colocarem a disposição a Igreja que é a terceira dimensão do nosso carisma. 

MAGIS Brasil: A Ordem de Santo Agostinho tem uma longa tradição de atuação com jovens, especialmente em espaços de formação, pastoral e espiritualidade. Como o senhor enxerga o modo como os agostinianos têm acompanhado as juventudes hoje e quais os principais desafios e aprendizados nesse processo? 

Fr. Gutemberg: A Ordem de Santo Agostinho em sua Tradição sempre buscou está próximos aos jovens por acreditar que eles possuem uma capacidade de sonhar e transformar as realidades na qual estão inseridos, assim como o próprio Santo Agostinho, que na sua época era um jovem inquieto e buscador da verdade. 

Trabalhar com os jovens é sempre um bonito e grande desafio. Os Agostinianos atuam com os jovens principalmente nas unidades educativas e paróquias de forma sempre muito próxima, buscando acolher as suas inquietações, próprias de cada tempo, lugar e cultura, promovendo ambientes de encontro com Deus, com eles mesmo e com os irmãos. Os frades têm a missão de ser “o irmão mais velho” que anima e acompanha de perto, se faz presente, é mais um com eles, e quando precisa, também os ajuda a retomar o bom caminho. 

Acredito que o maior desafio nesse momento é despertar novamente neles o sentido da transcendência. A pandemia, as tecnologias e redes sociais deixaram os nossos jovens muito isolados e com relações construídas de maneira muito artificiais e distantes. Trazê-los para uma vida fé, comunhão, partilha, de uma escuta autêntica com certeza é o desafio que temos pela frente. 

Diante das dificuldades apresentadas também temos aprendidos muitas coisas, mas desejo destacar que a maior delas é o propósito. Os nossos jovens estão carentes de propósito. Quando lhes apresentamos um propósito consistente que lhes façam sentido, uma oportunidade de serem protagonistas, estarem na linha de frente e com uma comunidade de jovens como eles em torno dessa mesma causa, eles  sentem-se motivados e, claro, atraem outros para fazerem a experiência de Deus. 

MAGIS Brasil: Com a eleição de Leão XIV, o primeiro Papa agostiniano da história recente, que expectativas se abrem para a Igreja e, em particular, para o trabalho com os jovens? Que traços do carisma agostiniano o senhor acredita que podem inspirar o estilo pastoral do novo pontificado? 

Frei Gutemberg: Permitam-me lembrar as primeiras palavras do nosso querido Papa Leão XIV: “sou filho de Agostinho, sou Agostiniano”. Acredito que essas palavras já são um grande sinal daquilo que o Papa Leão é em sua essência: um homem que se identifica e vive profundamente o carisma agostiniano. Dito isso, minhas expectativas são muitas (risos), pois enquanto esteve conosco (na OSA enquanto Prior Geral) o até então Frei Robert Prevost foi um homem sempre próximo aos irmãos, esteve aberto ao diálogo e buscava a comunhão dentro e fora da Ordem. Ao olhar particularmente a juventude e o nosso carisma entendo que o Papa Leão vai dar continuidade ao caminho aberto pelo Papa Francisco com o adicional agostiniano: a inquietude, não no sentido meramente humano de “não ficar parado”, “inconstante”, pelo contrário, uma inquietude, aquela mesmo de Agostinho que está sempre em busca da Verdade e encontrando-A ajuda a tantos irmãos e irmãs a percorrer o mesmo caminho. E quando falamos da Igreja universal, compreendo que um traço importante é a Comunhão. Já podemos ver sinais claro nesse pontificado os esforços para que a Igreja seja esse sinal de unidade para si mesma e para a sociedade, pois para nós como filhos de Agostinho a vida em comunhão é algo muito valioso e esse traço carismático estará em evidência. 

Imagem: Vatican News

MAGIS Brasil: Em um contexto marcado por crises de sentido, excesso de informações e relações frágeis, o que a espiritualidade agostiniana tem a dizer aos jovens que buscam profundidade, pertença e uma fé com relevância no mundo de hoje? 

Fr. Gutemberg: Há dois elementos do carisma que falam muito aos jovens: a interioridade e vida em comunidade.  Com as palavras “conhece-te, aceita-te e supera-te”, ensinadas por Santo Agostinho, o jovem pode fazer o caminho da interioridade inicialmente conhecendo-se suas limitações e virtudes, aceitando quem é sem querer ser aquele influencer ou artista, mas com muita sinceridade aceitando a sua própria realidade, para que assim, a partir do seu verdadeiro ser (originalidade) possa superar-se e ser de fato, aquilo que Deus o chamou: um ser humano feliz e pleno.  E claro, nessa caminhada não estamos sozinhos, Santo Agostinho nos lembra que “necessitamos uns dos outros para sermos nós mesmos”, por isso viver em comunidade é algo essencial para um crescimento saudável, pois quando estamos juntos e unidos pela mesma fé na caminhada vamos nos fortalecendo e animando uns aos outros para que juntos sigamos com alegria esse percurso rumo ao céu, que é o objetivo final de todo cristão. 

A reflexão de Fr. Gutemberg sobre a espiritualidade agostiniana e o novo pontificado do Papa Leão XIV nos convida a aprofundar o compromisso com uma Igreja que quer ser casa de comunhão, espaço de encontro e horizonte de sentido para os jovens. Em sintonia com esse chamado, o MAGIS Brasil segue firme em sua missão de acompanhar, formar e inspirar as juventudes, buscando construir comunidades onde a interioridade, a vivência em grupo e o serviço à missão se tornem experiências concretas de fé e transformação. 

Neste contexto de desafios — como o isolamento social, a crise de propósito e a complexidade do ambiente digital — o carisma agostiniano traz contribuições valiosas para que os jovens possam encontrar na fé um caminho de autoconhecimento, pertencimento e protagonismo. O MAGIS Brasil reconhece que esse processo é feito juntos, em rede, apoiando iniciativas que promovem a justiça, a espiritualidade e a participação ativa dos jovens na Igreja e na sociedade. 

Assim, convidamos todas as redes, comunidades e agentes de pastoral a se inspirarem nesse legado de Santo Agostinho e na atual caminhada da Ordem para renovar a esperança e a alegria de ser Igreja em missão, seguindo o exemplo do nosso novo Papa e fortalecendo o protagonismo juvenil no Brasil. 

Fr. Gutemberg de Albuquerque Machado, OSA é religioso e presbítero na Ordem de Santo Agostinho na Província Agostiniana do Brasil onde atualmente exerce o cargo de conselheiro provincial para Educação e Assistência, diretor institucional do Colégio Santo Agostinho – SP, Coordenador da Comunidade de Jovens Agostinianos (setor juventude provincial) e membro da comissão de juventude da OALA (Organização dos Agostinianos de Latino América e Caribe). Além de Filosofia e Teologia, é formado em Pedagogia, especialista em Gestão escolar e Liturgia, Mestre em Educação pela PUC-SP e atualmente cursa mestrado em Direito Canônico no Instituto de Superior de Direito Canônico de Londrina – extensão da Gregoriana de Roma. 

Compartilhe :
Facebook
Email
Twitter
LinkedIn
WhatsApp
Deixe uma resposta