JUVENTUDES E ESCOLA: QUAIS OS CAMINHOS PARA O ENSINO MÉDIO? 

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Wagner Scopel Falcão

O ensino médio é uma etapa da educação básica brasileira definida pela nossa Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) – Lei nº 9.394/1996 que em 2026 completará 30 anos de vigência (Brasil. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996). Ao longo desse período, a lei passou por diversas alterações, decorrentes das demandas da sociedade e das transformações do mundo contemporâneo. Uma dessas alterações diz respeito à obrigatoriedade do ensino médio no Brasil: somente em 2009, por meio da Lei nº 12.061/2009 (Brasil. Lei nº 12.061, de 27 de outubro de 2009), foi garantida a universalização do ensino médio gratuito. Quatro anos depois, com a Lei nº 12.796/2013 (Brasil. Lei nº 12.796, de 4 de abril de 2013), a educação básica tornou-se obrigatória e gratuita dos quatro aos dezessete anos de idade. 

Na década passada a educação brasileira passou por intensos debates políticos, acadêmicos, escolares, midiáticos e sociais em geral, em especial quanto às discussões em torno de uma reformulação no ensino médio, assim como da elaboração de um documento curricular de abrangência nacional para a educação básica. Em 2016, logo após o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, seu vice, Michel Temer, assumiu o governo federal e, em menos de um mês após o afastamento definitivo de Dilma, publicou a Medida Provisória (MP) nº 746/2016 (Brasil. Medida Provisória nº 746, de 22 de setembro de 2016), que promoveu alterações no ensino médio brasileiro. No Brasil, a MP passa a valer a partir da data de sua publicação, mas precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional e pelo Senado Federal para se tornar lei, caso contrário perde sua validade. Após tramitações e ajustes, a MP nº 746/2016 transformou-se na Lei nº 13.415/2017, que alterou a LDB e ficou conhecida como Reforma do Ensino Médio ou Novo Ensino Médio (NEM) (Brasil. Lei nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017). O ensino médio voltou a sofrer alterações a partir de 2023, já no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que propôs ajustes no NEM. As mudanças foram sancionadas por meio da Lei nº 14.945/2024 (Brasil. Lei nº 14.945, de 31 de julho de 2024). 

Paralelamente, discutia-se a criação de uma base curricular nacional, prevista desde a LDB de 1996 em seu artigo 26: “Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela” (Brasil. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996). Apesar de prevista em lei, essa base só ganhou força nos debates a partir da década de 2010. Após anos de discussões e mudanças na equipe responsável, decorrentes das transições de governo, foi publicada em 2017 a primeira versão da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), abrangendo a educação infantil e o ensino fundamental (Brasil. Base Nacional Comum Curricular, 2017b). Já a parte referente ao ensino médio foi publicada apenas em 2018, em razão da MP nº 746/2016 e à Lei nº 13.415/2017 (Brasil. Base Nacional Comum Curricular, 2018). Em 2022, durante o governo Jair Bolsonaro, foi publicado ainda um documento complementar intitulado “Computação na Educação Básica – Complemento à BNCC”, que apresentou um conjunto de competências e habilidades na área da computação a serem desenvolvidas pelos estudantes da educação básica (Brasil. ase Nacional Comum Curricular: Computação – Complemento à BNCC). 

Reformas educacionais como a do NEM e da BNCC não se concretizam da noite para o dia. Podem até ser implementadas de forma célere por força de lei, mas, em um país de dimensões continentais e com diversidade cultural tão marcante quanto o Brasil, os desafios são enormes. Construir um sistema de ensino que atenda a todos os interesses sem promover apagamentos culturais ou sociais é tarefa complexa. Ao relacionarmos essas discussões ao tema “juventudes e ensino médio”, a questão se torna ainda mais sensível, pois o Brasil garantiu a universalização e a obrigatoriedade dessa etapa há menos de duas décadas. 

Vivemos hoje em um mundo atravessado pela globalização desde a segunda metade do século XX, com rápidas e intensas transformações tecnológicas, culturais, sociais, econômicas, políticas e ambientais, que impactam diretamente a forma como as juventudes são formadas e se relacionam com o meio em que vivem. Mais recentemente, ingressamos na era da Indústria 4.0, que intensifica essas transformações e amplia os desafios para a educação. Nesse cenário, cabe perguntar: como as escolas e os sistemas de ensino estão reagindo? 

Minha primeira experiência profissional com o ensino médio ocorreu em 2007 e, desde então, percebo recorrentes inquietações entre estudantes, professores e demais profissionais da educação acerca da identidade dessa etapa da escolarização, em especial no que se refere ao sentido de ensinar e ao conteúdo a ser ensinado. À época, predominava um ensino médio generalista, baseado em um currículo comum. Com o NEM, a proposta passou a caminhar para especializações, os chamados itinerários formativos. Seria essa uma mudança capaz de dialogar com a pluralidade das juventudes atuais? Ou trataria apenas de uma alteração superficial, ainda insuficiente para atender às demandas contemporâneas? 

Assim também, permanecem em aberto algumas questões fundamentais: que ensino médio as juventudes querem? Que ensino médio devemos propor? Que juventudes desejamos formar? Ou, talvez, não seria o caso de inverter a lógica e reconhecer que são os jovens que deveriam pautar essas questões, assumindo de fato o protagonismo de suas histórias? Essas são reflexões que este artigo propõe levantar e discutir ao longo do mês de setembro.

REFERÊNCIAS: 

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 1996. Versão original. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1996/lei-9394-20-dezembro-1996-362578-publicacaooriginal-1-pl.html>. Acesso em 01 set. 2025. 

BRASIL. Lei nº 12.061, de 27 de outubro de 2009. Altera o inciso II do art. 4º e o inciso VI do art. 10º da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, para assegurar o acesso de todos os interessados ao ensino médio público. Brasília, 2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/L12061.htm>. Acesso em 01 set. 2025. 

BRASIL. Lei nº 12.796, de 4 de abril de 2013. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para dispor sobre a formação dos profissionais da educação e dar outras providências. Brasília, 2013. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Lei/L12796.htm#art1>. Acesso em 01 set. 2025. 

BRASIL. Medida Provisória nº 746, de 22 de setembro de 2016. Institui a Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral, altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e a Lei nº 11.494, de 20 de junho de 2007, e dá outras providências. Brasília, 2016. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Mpv/mpv746.htm>. Acesso em 01 set. 2025. 

BRASIL. Lei nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017. Altera as Leis nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e 11.494, de 20 de junho de 2007, a Consolidação das Leis do Trabalho e outros dispositivos; institui a Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral. Brasília, 2017a. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13415.htm>. Acesso em 01 set. 2025. 

BRASIL. Lei nº 14.945, de 31 de julho de 2024. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) e outras leis correlatas. Brasília, 2024. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2024/lei-14945-31-julho-2024-796017-publicacaooriginal-172512-pl.html>. Acesso em 01 set. 2025. 

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017b. Acesso em 01 set. 2025. 

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2018. Acesso em 01 set. 2025. 

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular: Computação – Complemento à BNCC. Brasília: MEC, 2022. Acesso em 01 set. 2025. 

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