Ronnaldh Oliveira

A comunicação sempre foi uma peça-chave para a missão da Igreja. Desde os tempos de Jesus, quando Ele instruiu Seus discípulos a proclamar a Boa Nova por todo o mundo (cf. Mc 16, 15-20), a Igreja tem se empenhado em espalhar Sua mensagem. Durante séculos, isso foi feito apenas através da pregação, da arte e de várias outras formas de expressão, sempre com o objetivo de compartilhar o ensinamento de Jesus Cristo e a doutrina católica.

Com a globalização e a chegada das plataformas digitais, surgiram novas ferramentas para essa missão. Sites, blogs, e-mails e, mais recentemente, redes sociais se transformaram em espaços concretos para a presença cristã. A pandemia do COVID-19, que assolou todo o mundo, destacou ainda mais essas ferramentas, que se tornaram essenciais para muitos, inclusive para os cristãos.

Desafios e Oportunidades no Mundo das Redes Sociais

O isolamento social e a impossibilidade de participar presencialmente dos ritos litúrgicos levaram a uma explosão de transmissões ao vivo de missas e outras celebrações nas redes sociais. Congregações religiosas, institutos de vida consagrada, dioceses e até cristãos anônimos se lançaram nas “rodovias digitais”, para que o processo evangelizador, antes entendido apenas como eficaz no chamado “presencial”, fosse também, por meio das telas, profundo e competente.

O Vaticano também adotou essa prática, transmitindo diariamente a missa presidida pelo Papa Francisco na Capela da Casa Santa Marta. Um marco desse período foi a ‘Statio Orbis’ em 27 de março de 2020, onde o Pontífice, diante de uma Praça São Pedro vazia, pediu o fim da pandemia. Esse evento mostrou claramente que os meios digitais são uma poderosa ferramenta para o ministério da Igreja, trazendo dados concretos de “cerca de 6 milhões de espectadores no canal YouTube do Vatican News e 10 milhões de espectadores no Facebook. Esses números não incluem visualizações posteriores da gravação do evento, nem visualizações através de outros canais” (Ruffini, 2023).

Outro ponto relevante a ser citado foi a contribuição dos jovens para que a comunicação social ocorresse em milhares de lugares. Foram as juventudes que assumiram o desafio de levar a Igreja para as casas. Uma missão que colocou a Pastoral da Comunicação na linha de frente da Igreja, sendo mais um espaço efetivo de contribuição das juventudes. Com o aprofundamento da PASCOM em todo o território nacional, com subsídios mensais de espiritualidade e engajamento eclesial, foi-se notando uma nova forma de ser “grupo de jovens” a fim de incluir também aqueles que estavam afastados.

Embora a pandemia tenha evidenciado a importância da presença cristã nas redes, ela também trouxe desafios. A espetacularização dos ritos e o uso das redes em substituição às relações sociais são alguns desses desafios. Em vez de promover a necessidade de uma presença plena, esses espaços podem se tornar locais de individualismo, afastando os fiéis da comunidade física cristã, que são lugares, por excelência, do Encontro.

Essa individualidade digital pode ser perigosa, especialmente quando se perde de vista que a Igreja se realiza também nas comunidades locais, especialmente na liturgia eucarística. Missas celebradas apenas para a web, com o padre como protagonista, correm o risco de transformar a celebração em um show, desviando a atenção do mistério de Cristo. É necessário lembrar que a liturgia deve ser um encontro real com Jesus, não um espetáculo visual ou virtual, como confessa a Igreja: “Cristo está todo inteiro presente em cada uma das espécies e todo inteiro em cada uma de suas partes” (João Paulo II, 1994, p. 1377). “Essa presença se denomina ‘real’, não a título exclusivo, como se as outras presenças não fossem ‘reais’, mas por excelência, porque é substancial, e por ela Cristo, Deus e homem, se faz totalmente presente” (Paulo VI, 1965).

De qualquer forma, é certo evidenciar que a meneira como o ser humano lida consigo mesmo, com o outro e com o transcendente após a pandemia é diferente de antes. Práticas, metodologias, modos de enxergar processos, encarar o serviço pastoral e até se relacionar com a própria juventude, nativa digital, precisam ser cada vez mais revistos em nossos ambientes eclesiais. Não se trata de criar uma pedagogia plenamente digital, mas, sobretudo, saber integrar os dois processos a fim de que dialoguem cada vez mais e gerem vida em abundância.

Integrando o Evangelho no Mundo Conectado

Essas reflexões não devem nos levar a duvidar da eficácia das redes sociais, mas sim a reconsiderar nossa abordagem pastoral-digital. A internet é uma rede de pessoas, e é crucial ouvir e falar com o coração, promovendo a cultura do encontro nas redes. Os cristãos devem viver como ‘outros Cristos’ também no mundo digital, comunicando vida e testemunhando a fé, como já evidenciou o Papa Francisco em tantos discursos e alocuções.

Adaptar a mensagem do Evangelho à cultura das redes sociais é essencial. São Paulo nos ensinou a nos adaptar para alcançar todos, e esse princípio ainda se aplica hoje. A integração do Evangelho às novas tecnologias deve respeitar sua mensagem, enquanto adapta sua linguagem para alcançar novos públicos.

Sabemos todos que o Evangelho é também inclusão. As redes sociais fogem da regra das grandes mídias onde há um que fala e outro que escuta. Não dá mais para falar achando que não haverá uma resposta rápida. Neste habitat onde todos possuem voz, a Igreja precisa criar espaços de “escuta atenta com o coração”, onde nas salas virtuais ou nos comentários e compartilhamentos de conteúdos nas variadas redes já se é uma resposta, uma abertura ao diálogo. Dessa forma, deixamos de lado o perigo da autorreferencialidade, onde apenas um tem voz, e crescemos na certeza da presença do Cristo quando a comunidade está reunida e pode dizer o que pensa, sente e acredita, tendo em vista a Verdade.

Essa incorporação correta é vital para vencer o tecnicismo, que acredita que a tecnologia é suficiente por si só. Superar essa visão e integrar a linguagem das redes ajudará a “purificar” as transmissões, reconduzindo a centralidade do culto eucarístico e não a figura do sacerdote ou às câmeras. As transmissões podem se tornar um espaço para o anúncio da Palavra de Deus e uma oportunidade para os internautas redescobrirem o valor da Eucaristia e a própria beleza da comunidade cristã, de sua pastoral e magistério.

A comunicação eclesial para além dos murais de eventos passados e dos “avisos paroquiais online” são espaços fecundos de vivenciar a pastoral. Reunir homens e mulheres, jovens e velhos, de perto ou de longe, para difundir juntos a partir da experiência que cada um traz consigo, a Boa-Nova encarnada na vida cotidiana. Abordar temas importantes para um público-alvo, ganhar tempo, romper barreiras territoriais e ser presença plena, sem negociar aquilo que é inegociável e sem se vender por engajamentos rápidos ou “modas” que se esvaem rapidamente é uma grande oportunidade de ser unidade e corpo eclesial.

O maior desafio digital da Igreja hoje é não apenas ter uma presença relevante, mas levar os internautas a uma presença plena, transformando ‘likes’ em ‘améns’. Isso significa converter os internautas em fiéis que redescubram na celebração comunitária um momento privilegiado para viver sua fé e encontrar o Senhor real e presente no partir do Pão, como já rezamos na passagem bíblica dos “Discípulos de Emaús”, que somente após realizarem esse encontro, voltaram animados para anunciar o que viram e ouviram.

Não é difícil encontrar protestos que digam acerca da “supersaturação” de atividades eclesiais nos meios digitais e que “ninguém aguenta mais”. A questão talvez leve à reflexão quando nos deparamos com pesquisas como a da TELECOM-BRASIL que aponta a média diária de consumo de 9 horas e 32 minutos por brasileiros no ambiente digital. Não é tanto a presença eclesial nas redes, mas como ela está de fato se adaptando a essa realidade. Um conteúdo criado para o presencial e igualmente apresentado virtualmente é um pedido claro para não ser validado pelos consumidores.

Dito isso, para além de religiosos criarem dancinhas no TikTok e responderem caixinhas de perguntas no Instagram, é necessário ver o testemunho cristão começar nas redes e frutificar no offline. Não se trata apenas de palavras, mas de comunicar a vida que recebemos em Cristo.

Para uma verdadeira evangelização na era digital a partir da Igreja, é necessária uma mudança de mentalidade e atitudes, tanto da instituição quanto dos fiéis. Essa inculturação será completa se a mensagem final for a de Jesus, que nos chama a amar uns aos outros como Ele nos amou. Somente assim, a evangelização será completa, tanto no digital quanto na pastoral, trazendo frutos para a missão integral da Igreja.

Referências

  • Francisco. Mensagem para o 48º Dia Mundial das Comunicações Sociais. 2014.
  • Francisco. Discurso no Ângelus, 27 de agosto de 2023.
  • João Paulo II. Catecismo da Igreja Católica. 1994.
  • Paulo VI. Carta Encíclica Mysterium Fidei. 1965.
  • Ratzinger, Joseph (Bento XVI). O Espírito da Liturgia. 2005.
  • Ruffini, Paolo. Comunicação e Pastoral na Era Digital. 2023.
  • Vidales, C., Aldea, C., & de la Viña, C. Desafios e Perspectivas da Evangelização Digital. 2011.
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