Alessandra Aparecida Custodio
O cultivo da espiritualidade sempre possibilita uma vida mais integrada em Deus. Na caminhada cristã, sobretudo quando vivida com o ardor e a inquietude da juventude, torna-se fundamental alimentar uma espiritualidade que favoreça o diálogo, aproxime Criador e criatura e ilumine o caminho pessoal e comunitário. Dentre os muitos itinerários de fé que inspiram a Igreja, a espiritualidade inaciana, nascida da profunda experiência de conversão de Inácio de Loyola, revela-se especialmente fecunda. Pela força dos Exercícios Espirituais (EE), convida à escuta interior, ao discernimento atento e ao engajamento generoso na missão, como expressão do seguimento de Jesus.
A vida de Inácio, como aponta o Pe. Arturo Sosa, SJ, é testemunho de uma experiência que não reduz, mas amplia o olhar: para si, para a humanidade e para a história (SOSA, Arturo. A Caminho com Inácio. p.23). Essa amplitude, marcada por uma visão universal e de longo prazo, ajuda as juventudes a se projetarem além do imediatismo, discernindo com profundidade seus passos e decisões em vista do bem mais universal. Para um mundo fragmentado, essa perspectiva estratégica, nascida da intimidade com Deus, oferece horizonte, sentido e missão.
Além disso, Inácio é companheiro das juventudes porque compreendeu que a conversão não é um ponto de chegada, mas um processo contínuo. Como ele mesmo viveu, a transformação interior supõe crises, escuta e descentramento. Nesse sentido, os Exercícios Espirituais se tornam um caminho pedagógico de liberdade e autenticidade, especialmente quando adaptados à vida cotidiana dos jovens, como nos Exercícios Espirituais em Etapas para Jovens (EEJ) e Exercícios na Vida Cotidiana (EVC). Eles possibilitam que o/a jovem, entre tantas atividades e desafios, reencontre seu centro em Cristo e construa, pouco a pouco, um projeto de vida em consonância com o Reino.
Por fim, Inácio é companheiro porque cultivou uma mística do cotidiano, ensinando a buscar e encontrar Deus em todas as coisas. Sua espiritualidade é profundamente encarnada e nos convida a integrar fé e vida, oração e ação, desejo e missão. Essa mística ajuda o e a jovem a experimentar uma espiritualidade concreta e transformadora, que nasce do encontro com Cristo e se traduz em serviço, cuidado e responsabilidade pelo mundo.
Inspirado nesses três pilares – horizonte universal, conversão permanente e espiritualidade cotidiana – quero refletir sobre como Santo Inácio de Loyola continua sendo um verdadeiro companheiro das juventudes: alguém que caminha ao lado, inspira o desejo de amar e servir, e ajuda a reconhecer Deus no coração da história pessoal e coletiva.
Vale lembrar que foi ele mesmo quem, em primeiro lugar, viveu e experimentou essa experiência espiritual como um presente de Deus. Sentindo-se profundamente tocado por não estar sozinho, logo desejou compartilhar com seus amigos esse sentimento transformador. Ao experimentar em sua própria carne ele foi se fazendo um mestre de vida espiritual neste caminho dos Exercícios Espirituais, por isso manteve em seu coração essa atenção atenta e cuidadosa de todos os que se aproximassem dessa experiência fossem acompanhados para melhor viver e sentir que este Deus faz caminho com cada pessoa a ponto de nos lembrar no Evangelho a voz de Jesus que nos chama de amigos (cf. Jo 15,14).
A presença do acompanhante espiritual é de valor inestimável na caminhada de fé de cada pessoa. O acompanhamento espiritual é serviço nascido de um verdadeiro chamado de Deus, uma vocação que nasce do coração d’aquele que deseja estar próximo de seus filhos e filhas em todos os momentos da vida.
O acompanhante espiritual é alguém que se dispõe a escutar com o coração, a acolher com ternura e a ajudar com sabedoria aquele que se aproxima em busca de sentido, consolo ou discernimento. Sua missão não é oferecer respostas prontas, mas ajudar o outro a perceber a presença amorosa de Deus em sua própria história, mesmo nos momentos de dor, dúvida ou silêncio.
Essa missão exige mais do que boa vontade: requer uma vida de profunda intimidade com Deus, sustentada pela oração constante, pela escuta atenta da Palavra e pela abertura ao Espírito Santo. O acompanhante é chamado a ser um instrumento de paz, luz e discernimento, alguém que caminha ao lado, sem julgar, sem impor, mas com humildade e reverência pelo mistério da vida do outro.
“A familiaridade com Deus, por meio da oração,
Ajuda(o) acompanhante a “sentir e a saborear” a presença de Deus em sua vida
A descobrir que Deus trabalha, Deus atua., Deus está aí.
A pessoa de fé é capaz de transmitir
Deus e, principalmente, ajudar o jovem a dar-se
Conta desta presença serena, próxima e amiga.”
(CAPRINI, Pe. Jonas. Exercícios Espirituais para jovens.)
Não é à toa que o verdadeiro acompanhante espiritual é alguém que vive o que anuncia. Ele ou ela sabe que só pode ajudar o outro a encontrar Deus se também estiver em constante busca, em contínuo diálogo com o Senhor. É uma presença discreta, mas firme; silenciosa, mas profundamente transformadora. Em um mundo marcado por ruídos, pressa e superficialidade, o ministério do acompanhamento espiritual se torna um sinal profético. Ele nos lembra que Deus continua falando, agindo e chamando e que muitas vezes, tudo o que precisamos é de alguém que nos ajude a ouvir com clareza e coragem essa voz que nos ama infinitamente.
A sensibilidade de Inácio a isto é de uma reverência inenarrável. Somente aquele que fez a experiência de ser acolhido em seu momento de dor pode olhar para a pessoa do outro e compreender de fato a necessidade do coração humano.
Um peregrino da alma transformado pela graça, ele se despojou de tudo aquilo que poderia ser obstáculo em sua jornada rumo à plena intimidade com Deus. Renunciou ao supérfluo, ao ego, às vaidades do mundo, e abraçou a simplicidade como caminho de liberdade interior.
Na solidão da oração e no silêncio que fala mais que as palavras, ele foi sendo moldado pelo Espírito. Seus olhos, antes ofuscados pelas ilusões terrenas, passaram a enxergar com a luz da fé. Tudo o que via, o sofrimento, a beleza, a injustiça, a criação, era agora contemplado com o olhar de quem ama com o coração de Deus. E então, já não vivia mais para si, se juntou aos demais para a maior glória de Deus em tudo amar e servir.
Se tornou companheiro e um incentivo para as juventudes, alguém que com seu exemplo de caminhada convida cada jovem a um encontro pessoal com Deus e com os outros. Convida a conhecer uma vez mais o seu contexto social, econômico e político. Chama a estar atento à sua realidade e se sentir responsável pelo mundo ao seu redor. Impele a tomar decisões discernidas e refletidas, que presta ouvidos ao Espírito e assim torna sua vida toda ao serviço dos outros.
“Amar a Ti Senhor em todas as coisas e todas em Ti, em tudo Amar e servir”.
REFERÊNCIAS
- SOSA, Arturo. A Caminho com Inácio. São Paulo: Loyola, 2021.
- IVES, Michael. Compreendendo os Exercícios Espirituais de Santo Inácio de Loyola. São Paulo: Loyola, 2024.
- RAMBA, Josep. Ignacio de Loyola: peregrino y guia. Centro de Pastoral Litúrgica.
- CARAVIAS, José L. MAGIS subsídios, Exercícios Espirituais para grupos. Guia de ajuda para leigos de comunidades cristãs. Rio de Janeiro: Centro Loyola de Fé e Cultura.
- LlÁCER, Mollá Darío. De acompañante a acompañante. Una espiritualidad para el encuentro. Colección Espiritualidad: Naecea, 2020.
- DOMINGUEZ, Luís Maria Garcia. O livro do discípulo: o acompanhamento espiritual. São Paulo: Edições Loyola, 2024.
- CAPRINI, Pe. Jonas. Exercícios Espirituais para jovens. Guia Inspirador. São Paulo: Edições Loyola, 2018.







