Ocupados e preocupados: modo sufocente de viver

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Ama e nem sabe mais o que ama (Adélia Prado)

Sabemos que a rivalidade e a competição, o desejo de poder e de resultados imediatos, a impaciência e a frustração e, acima de tudo, a angústia e o medo, criam suas exigências e preenchem todos os espaços vazios em nossa vida. Enquanto nossas mentes, nossos corações e nossas mãos estiverem ocupados, poderemos evitar o confronto com as questões dolorosas, às quais não queremos encarar. Estar ocupado tornou-se uma obsessão, um símbolo de status, e as pessoas incentivam umas às outras a manter o corpo e a mente em constante movimento. Estar ocupado, em contínua atividade, com agenda cheia, quase se tornou parte de nossa constituição.

À distância, parece que tentamos manter-nos ocupados com palavras e ações, sem tolerância por um momento de silêncio. Aqui não há lugar para espaços contemplativos e gratuitos. A maioria de nós procura uma ocupação, e não espaço livre. Quando não estamos ocupados, ficamos inquietos e ansiosos, ficamos até com medo quando não sabemos o que fazer agora, amanhã ou no ano que vem.

Espaços vazios tendem a nos deixar inseguros

Quando solicitados a sentar em uma cadeira, sem um jornal para ler, um rádio para ouvir, uma televisão para assistir, sem o celular nas mãos, ficamos tão inquietos e tensos que agradecemos por qualquer coisa que nos distraia novamente. Quando todo movimento à nossa volta tiver cessado, quando ninguém nos perguntar nada, ninguém nos pedir conselho nem oferecer ajuda, quando não houver música nem jornais, redes sociais ou eventos, sentiremos tal inquietude interior que aproveitaremos toda e qualquer oportunidade para envolver-nos novamente.

Isso explica por que o silêncio é tão difícil

Muitos dizem desejar o silêncio, a calma, a quietude, mas não conseguem suportar tempos e espaços repousantes. Ficar sossegado é perigoso: pode parecer doença. Recolher-se dentro de si mesmo ameaça quem leva um susto cada vez que examina sua alma.O silêncio nos assusta por retumbar no vazio dentro de nós. Quando nada se move nem faz barulho, notamos as frestas pelas quais nos espiam coisas incômodas e mal resolvidas, ou se enxerga outro ângulo de nós mesmos” (Lya Luft). É cada vez mais desafiante criar espaço aberto e receptivo, onde algo novo possa acontecer a nós; do mesmo modo, é urgente oferecer um espaço onde as pessoas possam se desarmar, deixar de lado suas preocupações e ocupações, e ouvir com atenção as vozes interiores.

Tudo isso mostra que, na verdade, a preocupação é um empecilho muito maior que a ocupação. Temos tanto medo de espaços abertos e lugares vazios que os ocupamos com nossas mentes mesmo antes de chegar. Nossas preocupações expressam nossa falta de habilidade de deixar resolvidas as questões vitais que nos inquietam. Somos compelidos a arranjar qualquer solução ou resposta possível que pareça ajustar-se à ocasião. Isso revela nossa intolerância frente à não compreensão das pessoas e dos eventos; procuramos rótulos e classificações para preencher o vazio com ilusões que criamos. Tornamo-nos pessoas bastante preocupadas, com medo da solidão sem nome e da solidão silenciosa. De fato, nossas preocupações evitam que tenhamos novas experiências e nos mantém nas trilhas conhecidas. A preocupação é a maneira medrosa de manter as coisas como estão; parece que preferimos uma certeza ruim a uma incerteza boa, afinal pra quê deixar o certo pelo duvidoso?

As preocupações ajudam a manter o mundo pessoal que criamos
e bloqueia a transformação revolucionária

Nossos medos, incertezas e hostilidades nos fazem preencher nosso mundo interior com ideias, opiniões, julgamentos e valores, aos quais nos agarramos como se fossem preciosas propriedades. Em vez de olhar de frente o desafio de novos mundos que se abrem e lutar em campo aberto, escondemo-nos atrás dos muros de nossas preocupações.

Jesus Cristo revelou que nossas preocupações impedem a vinda do Reino, ou seja, do novo mundo. Não podemos esperar que algo realmente novo aconteça se nossos corações e mentes estão tão cheios com nossas preocupações que sequer ouvimos os sons que anunciam uma nova realidade. 

Texto Bíblico  Mt 6, 25-34 / Lc 12, 22-32

 

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