O Deus em quem não creio

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“Quando foi que te vimos enfermo ou na prisão e fomos te visitar?”  (Mt 25,39)

Todo ser humano quer ser feliz, o desejo de felicidade é o dinamismo mais profundo que toda pessoa traz inscrita no íntimo do seu ser. Em outras palavras, a aspiração primeira que nos habita é a alegria de viver. Por isso, atentar contra a felicidade de viver é a agressão mais grave que se pode cometer contra o ser humano.

No entanto, na experiência de fé de muitas pessoas, a ideia de Deus, muitas vezes não se associa com a ideia de felicidade. De fato, são muitos os que veem em Deus um autêntico rival da própria felicidade. São muitas as pessoas que costumam relacionar Deus com a proibição de muitas coisas que lhes dão prazer e lhes fazem felizes, ou com a obrigação de fazer outras coisas que lhes são pesadas e desagradáveis. E, sobretudo, para muitos Deus é uma ameaça, uma proibição constante, uma censura, um juiz implacável com o código de leis nas mãos. Enfim, uma carga pesada que complica a vida, tornando-a sem sabor e sem sentido.

Muita gente vê em Deus a imposição de verdades que não compreende

Percebe em Deus a limitação da própria liberdade, a necessidade de submeter-se a poderes e autoridades que lhe causam repugnância. E são muitos aqueles cuja experiência de fé é vivida de maneira negativa sobre a consciência, acentuando os escrúpulos, fomentando divisões e enfrentamentos, comportamentos de caráter obsessivo, práticas piedosas carregadas de moralismo e expiação, entre outras patologias.

É evidente que um “Deus” assim gera nas pessoas sentimento de culpa, de insegurança e de medo. Naturalmente passamos a compreender porque muitas pessoas prescindem de Deus e, inclusive, recusam abertamente tudo o que se refere a Deus, à religião e aos seus representantes. Um Deus que é percebido e sentido como um problema, como um conflito para nossa felicidade, por mais que nos digam que Ele é bom, que nos ama e que é Pai, é e será sempre um inaceitável e até insuportável. Um Deus assim não tem e nem pode ter relação alguma com a aspiração maior que carregamos dentro de nós: o desejo de sermos felizes na vida.

Não se trata aqui de procurar construir uma imagem mais atrativa, nem de apresentar um Deus fake ou de acordo com nossas conveniências. Trata-se, antes de tudo, de compreender que hoje as pessoas já não suportam mais um Deus que impõe peso em seus ombros já com fardos. De onde vem tal compreensão de Deus? Tal imagem negativa e pesada nasce da compreensão a partir do poder, da grandeza, da majestade, da força que impressiona, da autoridade que se impõe e manda, da ameaça que causa medo e assusta a todos.

Não encontramos em Jesus Crucificado o Deus que se impõe,
mas o Deus do am
or que se expõe

Mas o Deus que Jesus nos revelou questiona radicalmente as imagens de poder e grandeza que o ser humano tende a formular sobre a divindade. O Deus que se revela em Jesus é compreendido a partir da fragilidade, da fraqueza. De fato, segundo São Paulo, a sabedoria de Deus se manifestou não no exercício do poder, mas na loucura e no escândalo da cruz (1Cor 1, 23-25). É na fraqueza extrema do Crucificado que podemos entender o sentido da onipotência de Deus, não como domínio da força sobre a fragilidade, mas como uma expressão de amor. Somente diante do Crucificado os cristãos podem confessar abertamente a onipotência de Deus, que é a do amor e que se expressou na mais profunda das fragilidades.

Além disso, Jesus revelou o verdadeiro modo de encontrar a Deus. Só na medida em que cada pessoa se faz solidária com a fragilidade, o que é mais profundo se funde com a fragilidade dos outros. Portanto, a fé madura em Deus não se reduz à segurança e firmeza em umas determinadas verdades. Mais importante que as verdades de nosso saber é a humanização de nossas atitudes. Por isso Jesus de Nazaré nasceu frágil e pobre, viveu entre os fracos e marginalizados, morreu como o ser mais repugnante, o mais desamparado deste mundo. Vivendo desta maneira, Jesus nos traçou o único caminho para encontrar a Deus: unir-se, fundir-se e confundir-se com tudo o que é fraqueza, dor, sofrimento e exclusão nesta vida.

As práticas de Jesus nos revelam um rosto diferente de Deus

Também nossa maneira de entender a Deus ficou radicalmente modificada. Aquele em quem cremos, tal como Jesus nos deu a conhecer, é um Deus tão simples como Jesus, tão próximo como foi Jesus, inclusive dos pecadores mais excluídos. Tão solidário com todos os fracos deste mundo, tão tolerante com todos os perdidos e marginalizados, e, sobretudo, tão humano. A imagem de Deus mais surpreendente encontrada nos Evangelhos é que Deus se fundiu com o ser humano. É na humanidade onde Deus se revela a nós e onde nós podemos encontrá-Lo.

Texto Bíblico  Mt 25, 31-46

 

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