O JOVEM INÁCIO

Edson Tomé Pacheco, SJ

De genealogia numerosa, o jovem Íñigo López de Oñaz y Loyola (nome de batismo de Inácio) nasceu em 1491 e cresceu em uma família tradicional do século XVI, da qual recebeu a sua formação de base, toda ela marcada pelo modo de ser e agir voltado para a nobreza e a cultura cavalheiresca. Pe. Laínez, um dos primeiros jesuítas, narra que Inácio é um “nobre de uma das principais casas de sua província”, advindo de uma família totalmente inserida na vida pública da corte e vinculada à Igreja. 

Avaliar as circunstâncias que envolveram os primeiros anos de Íñigo de Loyola é um desafio, uma vez que seus dados biográficos não são tão abundantes. A maioria deles se concentra em sua Autobiografia, narrada a Câmara, resumindo em poucas linhas quem foi Inácio em suas primeiras etapas da vida: “Até os 26 anos de idade foi um homem dado às vaidades do mundo, encantava-se com o exercício com armas e com um grande e vão desejo de ganhar honras”.  Neste sentido, sua vida está marcada por “uma rica mistura de profunda tradição religiosa e inserida numa cultura cavalheiresca, própria da aristocracia e da nobreza da época”.  

Depois de receber formação humana e cristã em seu entorno familiar, aos quinze ou dezesseis anos, Inácio vai para Arévalo (Ávila) para trabalhar na casa do nobre Juan Velázquez Cuéllar (1505), pois era costume que os senhores mandassem os filhos para a casa de algum nobre da corte para que ali se educasse nos modos e costumes da nobreza. Ou seja, é neste mundo que ele se fundamenta e constitui, não só pela tradição religiosa, mas também pela formação recebida na corte espanhola. São esses os elementos fundamentais que contribuem para a forma de pensar, ser e agir de Inácio.

Porém, uma experiência viria a mudar a vida do jovem para sempre. Gonçalves da Câmara narra na Autobiografia a defesa da fortaleza de Pamplona contra os franceses. Profundamente ferido e machucado, Inácio foi transferido para sua terra natal, onde iniciou um período de convalescença [Aut 2]. Depois de um processo de conversão motivado pela leitura da vida dos santos e da vida de Cristo, passou por uma série de mudanças que o levaram a deixar Loyola e fazer uma peregrinação até encontrar a vontade de Deus para sua vida. 

  • INÁCIO E OS JOVENS: O GRUPO COMO CAMINHO

A experiência grupal foi muito significativa na vida de Inácio de Loyola.  Por meio dessa vivência que ele concretiza seu serviço a Deus e seu desejo de ajudar a Igreja. Aos poucos, é marcado por uma grande dimensão comunitária e por um forte ideal apostólico que se traduzia no desejo dos primeiros estudos e a aproximação aos jovens com desejo de “ajudar as almas” através de conversas espirituais e exercícios espirituais. 

A primeira experiência de compartilhar a vida com outros, que deixou marcas em Inácio e foi compondo seu jeito de ser, se deu em território espanhol, tendo início em Barcelona e aprimorando-se a partir do que viveu em Alcalá e Salamanca, no período de 1524 a 1527.  Segundo Pe. Polanco, seu secretário, “começou ali (em Barcelona), ter o desejo de reunir algumas pessoas, para em sua companhia pôr em prática o desígnio que então lhe veio de ajudar e reforma as faltas no serviço divino, pessoas que fossem como trombetas de Jesus Cristo”. 

Ainda que seu desejo inicial fosse fazer um caminho solitário tendo “apenas a Deus como refúgio” [Aut 35]. Inácio passa por um processo progressivo de mudança que o leva, lentamente a buscar a outros para ajudá-lo na missão de comunicar a outros sua experiência de Deus.  Desta forma, ao retornar a Barcelona, depois de sua peregrinação a Jerusalém, (04a23/set de 1523), dá pela primeira vez os “Exercícios Espirituais” a quem os solicitava. Alguns jovens quiseram unir-se a ele para ajudá-lo em seu trabalho pastoral, entre eles estão Calixto de Sá, Lopes de Cáceres, Juan de Arteaga e mais tarde, Juan Reynalde [Aut 58]. 

Esta primeira experiência grupal formada por Inácio se dá na perspectiva do acolhimento, do acompanhamento e do discernimento da identidade resultando na missão. É inspiradora e cheia de riquezas, mas também é marcada por uma série de dificuldades que farão com que o grupo seja desfeito, levando Inácio a outros lugares. Depois do tempo compartilhado, os jovens retornam à vida normal, mas já não são mais os mesmos e tampouco o é Inácio. 

A experiência comunitária transforma internamente o Peregrino de Loyola, que, buscando outras terras, encontra pessoas em quem deixa e de quem recebe as marcas de Deus. Paris é o lugar que fortalece e confirma o sentido de caminhar em companhia de outros. Na cidade francesa, onde permaneceu durante os anos de 1528 a 1535, viveu de modo especial três diferentes momentos grupais: 

Vivendo no Colégio Montaigu, como aluno externo, para estudar humanidade, mora em uma pensão com outros estudantes espanhóis. E neste período começou a dar-se em “conversas espirituais”, mas do que de costumava. Além disso passou a apresentar seu tesouro espiritual. Naquela ocasião apresentou os Exercícios Espirituais a três estudantes, João de Castro, Pedro Peralta e Amador de Elduayen. Peralta e Castro. Tendo vivido uma profunda experiência de Deus por meio dos Exercícios Espirituais, passaram a dar tudo o que tinham aos pobres e a viver de esmolas, como Inácio, o que chocou e incomodou aqueles que os conheciam, dado que tinham grande relevância no meio universitário. Os jovens foram ameaçados com força armada para que desistissem de suas intenções de despojamento até terminarem os estudos [Aut 77-78].

Vivendo no colégio Santa Bárbara iniciou-se sobe a orientação do mestre João da Penha. Como pensionista viveu com outros estudantes, entre eles estão Pedro Fabro e Francisco Xavier com quem veio a cultivar uma grande amizade. Os desafios, porém, não são suficientes para minar a potência da vida partilhada. Em seguida, Inácio é marcado também pelo que vive ao lado dos jovens no convento dos Cartuxos. Aos domingos, se entretinham em conversas espirituais, se confessavam e comungavam. Contudo, estes compromissos coincidiam com disciplinas filosóficas que eram ministradas no mesmo dia e que estavam perdendo um número crescente de participantes. Por conta disso, Inácio chegou, inclusive, a ser castigado. Porém, não desanimou e recorreu para conseguir autorização para que seus encontros continuassem ocorrendo aos domingos e dias santos.

Num terceiro momento, em Paris, começou a ser lançada a semente que, em Roma, germinará como a Companhia de Jesus. Assim, é também na Cidade Luz que Inácio reúne o grupo dos “Amigos no Senhor”: Pedro Fabro, Francisco Xavier, Diego Laínez, Alfonso Salmerón, Nicolás Bobadilla e Simão Rodríguez. 

Os “primeiros companheiros” começam com uma relação informal no ambiente universitário a partir da aproximação de Inácio e da conversa espiritual. Essa amizade futuramente os levou a consagrar suas vidas a Deus e, depois de fazerem os Exercícios Espirituais, assumirem uma existência evangélica e apostólica em pobreza e no discernimento em comum. Neste período, Inácio se dedicou aos estudos, às amizades, à conversação espiritual e à aplicação dos Exercícios Espirituais. Esse novo grupo, com procedentes de diferentes nações e realidades sociais, cujas idades variam entre 19 e 43 anos, procurou ocupar-se do cuidado com os pobres, do acompanhamento de outros jovens e dedicou-se à missão da Igreja. Atraídos pela vida de Inácio, pela forma que se dedicou a “ajudar os demais”, pela sua maneira de ensinar a doutrina cristã e de se aproximar das pessoas, estes tinham o desejo de juntar-se a ele e colocar-se a caminho.

Inácio sempre teve uma sensibilidade para aproximar, encantar, acolher e ajudar os jovens na construção de seus projetos de vida, isso os conquistou e fez com que inúmeros deles seguissem os seus passos, o que iluminará a ação da Companhia de Jesus nos dias de hoje. 

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